A Igreja tem de sair da defensiva e do conforto, rumo às margens

https://www.snpcultura.org/imagens/porta_20200708_pc.jpgSe a história é verdadeira, uma das razões pelas quais Jorge Bergoglio se tornou papa foi uma breve intervenção que proferiu durante uma reunião pré-conclave sobre a necessidade de a Igreja sair. Muitos dos cardeais eleitores viram esta abordagem como a resposta à perceção de que a Igreja se tinha tornado excessivamente autorreferencial e defensiva. Ir para as margens era o caminho para renovar a identidade e a missão da Igreja de evangelização do mundo.

O Evangelho de hoje (8 de julho) mostra-nos Jesus a selecionar apóstolos para expandir a sua missão de pregação (Mateus 10,1-10). Os Doze representam uma amostra interessante do potencial e dos problemas humanos. É como se Jesus quisesse mostrar o poder da graça de criar uma comunidade a partir de personalidades muito diferentes, algumas, até, em conflito entre si. Quatro dos discípulos originais eram da Galileia: Pedro, André, Tiago e João, dois grupos de irmãos, todos pescadores. Os outros incluíam Mateus, um ex-cobrador de impostos, um zelota chamado Simão, uma pessoa prática chamada Filipe, um cético chamado Tomé, e alguém chamado Judas, que acabaria por ser um traidor.

Jesus dá-lhes autoridade para curar doenças e expulsar demónios. Até Judas está autorizado a pregar e a realizar esses milagres em nome de Jesus. Mas Jesus limita a missão deles: devem ir apenas para as «ovelhas perdidas da casa de Israel», não para os pagãos ou para a Samaria. Nesta fase do seu ministério, Jesus parece focado no povo judeu como a extensão do Reino de Deus.

Isto é revelador, porque cinco capítulos depois, Jesus passará a fronteira do território pagão quando encontra a mulher siro-fenícia, que lhe pede para curar a sua filha (15,21-28). A missão, e até o próprio Jesus, estão, aparentemente, ainda a crescer. Apesar da sua divindade, Jesus está a aprender a vontade do seu Pai de uma maneira humana, através de influências e encontros externos. O excecionalismo judaico está a ser estendido para a salvação universal.

A boa notícia para nós neste Evangelho é, em primeiro lugar, que pessoas imperfeitas são chamadas a ser apóstolos, pessoas com fraquezas e conflitos, algumas, inclusive, capazes de grandes pecados e fracassos. Os planos de Deus funcionam através de pessoas comuns que se debatem na comunidade.

Em segundo lugar, a vida humana baseia-se na aprendizagem e crescimento. A cada etapa, os limites caem em favor da liberdade da expansão dos nossos horizontes e da mudança d as nossas ideias, no sentido de fazermos coisas novas e maiores. Deus está sempre a autorizar mais vida, mais risco, mais criatividade. Não precisamos de permanecer na defensiva ou em zonas de conforto, dentro de limites familiares, e não nas margens, onde o crescimento acontece.

O significado da palavra apóstolo é "aquele que é enviado". A começar pelos profetas, todo aquele que é chamado a ser discípulo começa por dizer: «Aqui estou, Senhor, envia-me».


 

Pat Marrin
In National Catholic Reporter
Trad.: Rui Jorge Martins
Imagem: /Bigstock.com
Publicado em 08.07.2020

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