Papa sublinha vínculo entre desporto e solidariedade, e lembra que vencer é estar ao lado do último

Uma jovem de 11 anos em cadeira de rodas por causa de uma doença neurodegenerativa; uma atleta com deficiência intelectiva vítima de violência na escola; um migrante originário do Gana e desembarcado na Sicília depois de ter estado detido na Líbia; uma mulher detida numa prisão de Roma; uma jovem com mãe não italiana: foi esta a representação de desportistas recebida pelo papa Francisco, esta quarta-feira, após a audiência geral.

Os participantes no encontro estavam inscritos no “meeting” internacional “We run together – Simul Currebant”, organizado pela equipa oficial de atletismo da Santa Sé, a Athletica Vaticana, em colaboração com o Átrio dos Gentios e dois organismos desportivos italianos, marcada para esta quinta-feira, próximo da capital italiana, mas que foi adiado devido à pandemia.

A iniciativa foi apresentada a Francisco pelo cardeal Gianfranco Ravasi, presidente do Conselho Pontifício da Cultura, entidade do Vaticano responsável não só pela plataforma de diálogo entre crentes e não crentes que é o Átrio dos Gentios, como pela equipa de atletismo.

«Aquilo que citou o cardeal, a alegria de dar, de oferecer, de oferecer a beleza do desporto, a possibilidade de cada um: oferecer para a alegria e a felicidade dos outros algo que eu tenho. E isto é grande, é uma atitude humana, é criativa. E as pessoas oferecem até a vida pelos outros: as mamãs pelos filhos, e os papás pelos filhos, e tantos… Dar algo de meu pelos outros», observou o papa, em conversa com os desportistas.



Na corrida estavam inscritos atletas olímpicos e paralímpicos, refugiados, migrantes e pessoas detidas, que seriam também juízes da competição, «todos juntos e com igual dignidade», dando «testemunho concreto de como deveria ser o desporto



«Vós dais beleza aos outros, a beleza do desporto. Esta é uma coisa importante: compreender como dar beleza. Isto ajuda, porque aquilo que vós estais a fazer não é um exercício, digamos assim, de prática de velocidade ou de jogos, não. Isto é verdadeiro, mas há mais. É dar aos outros. É o moto da associação que é tão importante: vós não vos afastais dos outros, “You run together”, correis juntos, juntos», prosseguiu.

Francisco lembrou o excerto do Evangelho que narra como dois discípulos correram ao sepulcro de Jesus, na manhã da sua ressurreição: «Chega primeiro o mais jovem [João], e o mais velho [Pedro] fica para trás. Mas há sempre o respeito de esperar o outro. E há uma antiga regra medieval para os peregrinos, para aqueles que faziam as peregrinações aos santuários na Idade Média – ainda hoje se fazem, pensemos em Santiago de Compostela, por exemplo –, uma regra que diz: deve andar-se ao passo daquele que é mais frágil, daquele que caminha mais devagar».

«Esta é uma coisa muito bela, que devemos aprender, como humanidade: andar ao passo das pessoas que têm outro ritmo, ou pelo menos considerá-las e integrá-las no nosso passo», vincou.

Na corrida estavam inscritos atletas olímpicos e paralímpicos, refugiados, migrantes e pessoas detidas, que seriam também juízes da competição, «todos juntos e com igual dignidade», dando «testemunho concreto de como deveria ser o desporto, ou seja, uma “ponte” que une homens e mulheres de religiões e culturas diferentes, promovendo inclusão, amizade, solidariedade, educação», afirmou.



«Encorajo-vos, queridas amigas e queridos amigos desportistas, a viver cada vez mais a vossa paixão como uma experiência de unidade e de solidariedade. Os verdadeiros valores do desporto são particularmente importantes para enfrentar este tempo de pandemia»



«Amanhã [hoje] não se poderá correr com as pernas, mas poder-se-á correr com o coração. A “alma” deste “Meeting” inclusivo é solidária: correr juntos», destacou Francisco, referindo-se à iniciativa de beneficência associada à corrida que entregará os proventos a agentes de saúde dois dos hospitais italianos mais envolvidos na luta contra a pandemia.

Depois de manifestar contentamento por a iniciativa ser promovida pela Athletica Vaticana, «uma realidade que testemunha concretamente, nas estradas e no meio das pessoas, o rosto solidário do desporto», o papa elogiou as entidades promotoras, que «demonstraram sempre uma sensibilidade particular quanto às necessidades reais das pessoas».

«Encorajo-vos, queridas amigas e queridos amigos desportistas, a viver cada vez mais a vossa paixão como uma experiência de unidade e de solidariedade. Os verdadeiros valores do desporto são particularmente importantes para enfrentar este tempo de pandemia, e sobretudo o difícil recomeço. E com este espírito convido-vos a correr, juntos, a corrida da vida. Obrigado por tudo aquilo que fazeis», concluiu Francisco.


 

Rui Jorge Martins
Fontes: Sala de Imprensa da Santa Sé, Vatican News
Imagem: SIR
Publicado em 21.05.2020

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