Rezar cansa, a oração é cansaço. A oração é a obra mais difícil e
árdua, a tarefa nunca terminada pelo homem, aquele que o acompanha até
à morte.
A Escritura testemunha que orar é uma luta (cf. Êxodo 17,8-16; Génesis 32,23-33), em que os olhos se consomem (cf. Salmo 119,123), a garganta seca no seu gritar a Deus (cf. Salmo 22,26)... Na oração, o corpo impõe-se, faz sentir-se em toda a sua materialidade: entrar na oração exige, portanto, tomar consciência do corpo, até se chegar a uma atitude de profunda unidade diante do Senhor, até ao “habitare secum” [viver consigo mesmo sob o olhar de Deus], numa relação pacificada com o próprio corpo, percecionado como lugar da inabitação de Deus e «templo do Espírito Santo» (1 Coríntios 6,19).
Se este cansaço físico é uma constante da oração de todos os tempos, hoje somos particularmente sensíveis ao facto de a oração comportar uma série de condições contraditas pelos atuais ritmos da vida diária. Nos nossos dias é mais do que nunca árduo permanecer no silêncio, exigência humana muito antes de ser espiritual, necessária para voltar a dar unidade ao próprio ser, que arrisca a dissipação no excesso de palavras e de sons desarmoniosos; é difícil permanecer na solidão, parados durante um certo tempo e num mesmo lugar; é difícil aceitar a inatividade do tempo dedicado à oração. Parece quase uma loucura, na civilização do burburinho e das imagens, viver a atitude de quem se abre a discernir uma Presença silenciosa e invisível, e todavia capaz de perscrutar os sentimentos e os pensamentos do coração (cf. Hebreus 4,12)…
A Escritura testemunha que orar é uma luta (cf. Êxodo 17,8-16; Génesis 32,23-33), em que os olhos se consomem (cf. Salmo 119,123), a garganta seca no seu gritar a Deus (cf. Salmo 22,26)... Na oração, o corpo impõe-se, faz sentir-se em toda a sua materialidade: entrar na oração exige, portanto, tomar consciência do corpo, até se chegar a uma atitude de profunda unidade diante do Senhor, até ao “habitare secum” [viver consigo mesmo sob o olhar de Deus], numa relação pacificada com o próprio corpo, percecionado como lugar da inabitação de Deus e «templo do Espírito Santo» (1 Coríntios 6,19).
Se este cansaço físico é uma constante da oração de todos os tempos, hoje somos particularmente sensíveis ao facto de a oração comportar uma série de condições contraditas pelos atuais ritmos da vida diária. Nos nossos dias é mais do que nunca árduo permanecer no silêncio, exigência humana muito antes de ser espiritual, necessária para voltar a dar unidade ao próprio ser, que arrisca a dissipação no excesso de palavras e de sons desarmoniosos; é difícil permanecer na solidão, parados durante um certo tempo e num mesmo lugar; é difícil aceitar a inatividade do tempo dedicado à oração. Parece quase uma loucura, na civilização do burburinho e das imagens, viver a atitude de quem se abre a discernir uma Presença silenciosa e invisível, e todavia capaz de perscrutar os sentimentos e os pensamentos do coração (cf. Hebreus 4,12)…
O cristão, se quer ser e dizer-se realmente tal, deve opor-se
determinadamente à ideologia alienante do trabalho e da produtividade,
deve empenhar-se em encontrar o tempo para escutar Deus e dialogar com
Ele
Depois de ter decidido colocar-se nesta condição exterior, eis que se abre para o homem o exigente face a face com Deus, que provoca desorientação; quando nos colocamos seriamente nesta nudez diante de Deus, experimentamos medo, ficamos sem palavras, tornamo-nos inquietos… Mas é precisamente deste abismo que pode começar o caminho de comunicação na fé com o Senhor: só assim saberemos encontrar no diálogo interior com o Senhor pacificação e unidade de toda a nossa pessoa. Sem esquecer a dificuldade da luta contra as tentações, as quais pontualmente se desencadeiam quando nos colocamos em oração: «Filho, se te apresentas para servir o Senhor, prepara-te para a tentação» (Ben Sira 2,1); assim como a fadiga requerida pela necessidade de assumir os pensamentos de Deus, muito diferentes dos nossos, divergentes daqueles com os quais empreendemos a oração.
Neste esforço que cada um enfrenta só diante do Só é de grande conforto a certeza de se estar rodeado pela comunhão dos santos do Céu e da Terra. Aqueles que nos precederam no caminho de fé e os irmãos que nos circundam diariamente garantem-nos uma oração incessante, capaz de suprir os nossos momentos de dificuldade ou de vazio espiritual: esta é uma grande consolação, um estímulo para não desertar do cansaço da oração.
Não tenho tempo
A dificuldade mais frequente com que se embate a propósito da oração é da presumida falta de tempo. O refrão que articula os nossos dias é: «Não há tempo, não tenho tempo»… Em parte, isto é verdade: a vida atual, sobretudo a urbana, é marcada pela velocidade, por ritmos laborais frenéticos e por compromissos múltiplos, que certamente já não são aqueles do antigo tempo bíblico, ou até de algumas gerações anteriores à nossa.
No entanto, é preciso denunciar que a falta de tempo é quase sempre um álibi, uma má desculpa: é sabido, por exemplo, que são muitas as horas passadas pelos crentes à frente da televisão ou na internet. Por outro lado, também é verdade que encontramos sempre tempo para aquilo que realmente nos interessa… Seja dito claramente: aquele que afirma que não tem tempo para orar, confessa, na realidade, que é um idólatra. Não é ele, com efeito, a determinar o seu tempo, a exercitar sobre ele um domínio, a ordená-lo, mas é o tempo a dominar sobre ele. O cristão, se quer ser e dizer-se realmente tal, deve opor-se determinadamente à ideologia alienante do trabalho e da produtividade, deve empenhar-se em encontrar o tempo para escutar Deus e dialogar com Ele.
«Não nos devemos entristecer pela escassez do tempo disponível para nos
retirarmos para o quarto; devemos, antes, assegurarmo-nos de que estamos
prontos e plenos de desejo de comunicar com Deus»
Não é por acaso que ordenar o tempo é o mandamento primário na fé judeo-cristã: reservar tempo para Deus, distinguir tempos “outros” em relação àqueles destinados ao trabalho, é o significado da articulação sabática, das festas, dos ritmos da oração. A escuta de Deus é tão séria como o trabalho, e portanto não se podem dedicar à oração apenas retalhos de tempo; ela necessita de tempos fortes, de tempos precisos, que devem ter a precedência sobre o resto. Um sacrifício inteiramente consumado por Deus e possível a todos é precisamente a oferta a Deus do tempo, o bem mais precioso possuído pelo homem sobre a Terra. Mais: santificar parte do seu tempo e destiná-lo à oração é já, de alguma forma, aceitar morrer, perder concretamente um pouco da sua vida para o Senhor; talvez dar tempo a Deus seja tão difícil porque significa fazer as contas com a própria morte. Aliás, quem diz que acredita na vida eterna, na vida para além da morte, como faz para experimentar esta sua fé se não consagra tempo para entrar em comunhão com Deus aqui e agora?
O aspeto da disciplina do tempo não é, portanto, marginal, mas é central para a oração. Sem a escolha de um ritmo e de tempos próprios não é possível orar: é preciso dar-se tempos pré-fixados e ser-lhes fiel, de modo a orar não só quando se tem vontade, quando emocionalmente se está disposto a fazê-lo; não, a oração é a fadiga de cada dia, é o alimento quotidiano para a vida no Espírito. Escreveu Matta el Meskin, um grande pai espiritual do monaquismo egípcio do século XX: «Não nos devemos entristecer pela escassez do tempo disponível para nos retirarmos para o quarto; devemos, antes, assegurarmo-nos de que estamos prontos e plenos de desejo de comunicar com Deus: então dar-te-ás conta de que os minutos podem ser como dias».
Enzo Bianchi
In Perché pregare, come pregare, ed. San Paolo
Trad.: Rui Jorge Martins
Imagem: Tanacha/Bigstock.com
Publicado em 11.02.2020
SNPC
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