Vivemos num tempo marcado pela “crise”, na qual eu leio
sobretudo uma situação de “aporia”. Aporia como incerteza, como não
compreender e não saber, como não saber dizer nem decidir, fazer
opções…
E isto porque falta a operação árdua e paciente do discernimento, da leitura dos sinais dos tempos e das urgências emergentes hoje no nosso mundo globalizado, mas um mundo que deve ser antes de tudo lido e compreendido como mundo ocidental e europeu, o nosso mundo.
E o que observamos nesta hora? Uma incapacidade dos católicos de estar na polis, uma afonia devida a uma astenia da sua fé, mas também a um distanciamento, hoje consumado, do empenho político cristãmente inspirado. Como escreveu Severino Dianich, «a atual insignificância dos católicos na política é o sintoma de um descolamento da vida da fé do crente da perceção das suas responsabilidades políticas». (…)
Hoje, creio que é urgente aprender novamente a arte do diálogo, seja nas nossas Igrejas e entre elas, seja na sociedade. Somos autenticamente chamados a reinventar com inteligência e criatividade uma cultura do diálogo, para poder viver verdadeiramente juntos, e não só uns próximos dos outros. Gostaria, por isso, de fornecer alguns traços elementares para empreender este itinerário que está à nossa frente e nos espera.
A primeira etapa, parece-me, consiste na suspensão do próprio juízo para considerar o outro com simpatia. Tudo começa por aqui. O outro não se revela sempre “belo”, não gera necessariamente coisas, ou a atração ou a curiosidade. Na sua alteridade, os outros são “diferentes”, muitas vezes capazes de nos contradizer. Ter uma atitude de simpatia significa, num primeiro tempo, aceitar não compreender o outro, procurando, ao mesmo tempo, compartilhar-lhe os sentimentos, na convicção de que a verdade do outro tem a mesma legitimidade que a minha. Isto não significa a inexistência da verdade ou a equivalência de todas as verdades. Cada um pode manifestar a sua verdade com humildade, e deverá estar disposto a receber dos outros a verdade que sempre nos precede e supera. Mesmo quando estamos convencidos de que a nossa verdade dá sentido à nossa vida.
E isto porque falta a operação árdua e paciente do discernimento, da leitura dos sinais dos tempos e das urgências emergentes hoje no nosso mundo globalizado, mas um mundo que deve ser antes de tudo lido e compreendido como mundo ocidental e europeu, o nosso mundo.
E o que observamos nesta hora? Uma incapacidade dos católicos de estar na polis, uma afonia devida a uma astenia da sua fé, mas também a um distanciamento, hoje consumado, do empenho político cristãmente inspirado. Como escreveu Severino Dianich, «a atual insignificância dos católicos na política é o sintoma de um descolamento da vida da fé do crente da perceção das suas responsabilidades políticas». (…)
Hoje, creio que é urgente aprender novamente a arte do diálogo, seja nas nossas Igrejas e entre elas, seja na sociedade. Somos autenticamente chamados a reinventar com inteligência e criatividade uma cultura do diálogo, para poder viver verdadeiramente juntos, e não só uns próximos dos outros. Gostaria, por isso, de fornecer alguns traços elementares para empreender este itinerário que está à nossa frente e nos espera.
A primeira etapa, parece-me, consiste na suspensão do próprio juízo para considerar o outro com simpatia. Tudo começa por aqui. O outro não se revela sempre “belo”, não gera necessariamente coisas, ou a atração ou a curiosidade. Na sua alteridade, os outros são “diferentes”, muitas vezes capazes de nos contradizer. Ter uma atitude de simpatia significa, num primeiro tempo, aceitar não compreender o outro, procurando, ao mesmo tempo, compartilhar-lhe os sentimentos, na convicção de que a verdade do outro tem a mesma legitimidade que a minha. Isto não significa a inexistência da verdade ou a equivalência de todas as verdades. Cada um pode manifestar a sua verdade com humildade, e deverá estar disposto a receber dos outros a verdade que sempre nos precede e supera. Mesmo quando estamos convencidos de que a nossa verdade dá sentido à nossa vida.
As perguntas do outro tornam-se as minhas, as suas dúvidas sacodem as
minhas certezas, as suas convicções interpelam as minhas. Então
descobriremos que no diálogo conseguimos chegar a pensamentos nunca
antes pensados
A simpatia implica a empatia: impelir-nos-á ao encontro do outro não um impulso do coração, mas a capacidade de nos colocarmos no seu lugar, de o compreender a partir de dentro, fundando-se na nossa comum condição humana. A empatia permite perceber que a existência, por natureza, nunca é isolada, que «nenhum homem é uma ilha»: existe só na comunicação e na consciência da existência dos outros. O egocentrismo, a indiferença, o cinismo, o rancor são vencidos por este sentimento: dá-se, assim, espaço ao outro passando do medo ao acolhimento, portanto à abertura ao encontro.
Mas simpatia e empatia são só as condições de possibilidade de um diálogo fecundo de transformação e enriquecimento recíprocos: com efeito, do diálogo nunca se sai como se entrou, e o desafio do diálogo implica a disponibilidade para empreender esse caminho. Ao dialogar, emergem visões inéditas do outro, há uma aproximação ao fim dos preconceitos: há a descoberta daquilo que se tem em comum, mas também daquilo que falta a cada um. O espaço intermédio entre os dois rostos é a terra de ninguém que espera ser cultivada e tornada fecunda por palavras de acolhimento e reconhecimento. Esta terra do meio é o espaço do diálogo. E dialogando, dois rostos encontram-se um diante do outro, numa proximidade capaz de abrir à vida. Ocorre assim a contaminação e a deslocação das fronteiras: o outro, que eu colocava numa dimensão remota, revela-se muito mais próximo e semelhante a mim do que eu imaginava. A fronteira não é anulada, mas de lugar de conflitos e mal-entendidos torna-se lugar de pacificação e de encontro.
É verdade que se não esperamos nada do outro, o diálogo morre antes ainda de nascer. Mas se estamos disponíveis a acolher o outro como “hóspede interior”, reconhecendo-lhe os traços presentes em nós, então desencadeia-se a centelha do diálogo autêntico: dá-se tempo ao outro, trocam-se palavras que se tornam dons recíprocos. O diálogo torna-se, assim, aquilo que a própria palavra “dià-lógos” diz: um entrecruzar de linguagens, de significados, de culturas. As perguntas do outro tornam-se as minhas, as suas dúvidas sacodem as minhas certezas, as suas convicções interpelam as minhas. Então descobriremos que no diálogo conseguimos chegar a pensamentos nunca antes pensados, com a fascinante perceção de os sentir a um tempo inauditos e, no entanto, familiares a nós mesmos, fazendo a experiência de sermos há muito habitados por realidades que estávamos convencidos de ignorar.
No diálogo, o outro faz-se revelação de um dom que vem de outro lugar e depois vai para outro lugar. Torna-nos possível a descoberta inédita da nossa própria existência. Com palavras e gestos faz aflorar a interioridade que está em nós, e faz-nos o grande dom de nos revelarmos a nós próprios de um modo novo.
Enzo Bianchi
In Monastero di Bose
Trad. / edição: Rui Jorge Martins
Imagem: "Mirror" (det.) | Jaume Plensa | D.R.
Publicado em 13.02.2020
SNPC
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