Uma das muitas coisas interessantes do
Cristianismo é obrigar-nos à constante inversão da lógica do pensamento.
Este exercício é desafiador, mas duro,
pois implica pensar ao contrário do mundo, isto é, de forma inversa ao modo
como nos ensinam. “Pois também o
Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em
resgate por todos. (Mc 10, 45)”; é esta a
lógica do Céu, muito diferente daquela que aplicamos e vemos no nosso
quotidiano. Um Deus que serve, um “poderoso” que se verga.
Vem
isto a propósito do dia do Pai que se celebra hoje. Num dia como este,
centramos a nossa atenção na celebração do dom da paternidade, da alegria de
ser pai, pedimos aos filhos que se lembrem dos seus pais, mas sendo tudo isto
importante e de realçar, esta forma de estar está posicionada na lógica do
mundo. A lógica do Céu é outra!
Somos
pais porque houve um filho que nasceu, fruto da entrega de uma mulher, que nos constituiu
como tal. Sem isso, nunca, por nossa única iniciativa, seríamos pais.
Assim, sob a lógica do Céu, deveríamos neste
dia recordar que um pai, à imagem do Pai, se encontra ao serviço: da sua mulher
e dos seus filhos e que por eles deveria dar graças; são eles que nos
possibilitam ser o que somos ou que nos vamos esforçando por ser.
É dia
de nos darem presentes e se recordarem de nós como pais, mas é também dia para
que nós não nos esqueçamos que estamos ao serviço, que nos devemos apagar para
que outros brilhem. Esta é a lógica do Céu. Isto é a lógica do Amor: “Quem
quiser ser grande entre vós, faça-se vosso servo (Mc 10,43)”
Também
hoje nos recordamos dos desafios de ser pai, diria, de ser pais, isto é, pai e
mãe, porque não há um sem o outro.
Muitas
são os desafios com que nos deparamos hoje em dia e condicionam a nossa vida de
família: os extensos horários de
trabalho que nos estafam, a pressão económica e financeira, a síndrome do
“motorista”, as múltiplas actividades onde cansamos os nossos filhos, e por aí
fora…mas será a educação, não a formação, aquela que mais nos deveria preocupar,
pois dela depende a essência do homem que estamos a criar.
Vivemos
hoje uma guerra de culturas. Talvez todas as gerações o tenham dito, mas com
esta forma tão agressiva, nunca, nos tempos mais recentes, se tinha visto. Mas
caminhamos ingenuamente como se nada fosse.
Muito
recentemente numa instituição britânica, um grupo de pais, maioritariamente
mulçumanos, suspendeu a ida dos seus filhos à escola, porque não estiveram de
acordo com um programa de doutrinamento a que os seus filhos de 11 anos estavam
a ser expostos. Segundo os pais, não fazia sentido expor crianças de 11 anos a
problemáticas para quais o interesse ainda não tinha despertado. Mas se isto é
notícia, a reacção dos responsáveis também deveria ser. Alegavam eles que não
tinham que dar conhecimento aos pais ou pedir-lhes autorização, colocando em
causa o poder paternal. É grave e assustador, mas como é “longe”, não nos toca.
(artigo
completo em: lifesitenews.com; datado de 07-03-2019)
Mas, não
nos toca? Isto passa-se nas nossas escolas e não fazemos caso!
A
ideologia que à força querem passar aos nossos filhos, vai-lhes alterar
profundamente a concepção de corpo, de pessoa e consequentemente das relações
humanas, e inevitavelmente o modo como entendemos o serviço a entrega ao outro,
o ser gratuito. Princípios e valores , que transversais a toda a sociedade, nos
vão mantendo organizados e que nos possibilitaram o avanço em tantos campos das
relações humanas.
Veja-se
recentemente o caso de um deputado que se viu a braços com um processo, pois
deu voz à inquietação de muitos pais, relativamente programas de “igualdade de
género” e “orientações sexuais”.
Sim, é
disto que falamos. Uma profunda alteração no modo de entender o ser, criado à
imagem do Pai.
A
escola é um desafio para os pais, onde eles deveriam colocar toda a sua
atenção, tornando-se mais interventivos, refreando os avanços de perigos reais
e que há muito estão a ser preparados.
Note-se,
a propósito. Em 1936 no livro, A Revolução Sexual de Wilhelm Reich, explica este
que “as crianças sexualmente ativas serão
revolucionárias naturais contra a ordem estabelecida, nomeadamente contra
instituições consolidadas, como a família, o casamento” (bases na quais
assenta o nosso modelo de sociedade e que nos tem humanizado). Ainda mais
recentemente, em Eros e a Civilização, Herbert Marcusse veio repetir a fórmula:
“A erotização de crianças, adolescentes e
jovens levará à desintegração das instituições em que foram organizadas as
relações privadas. (…) Ao erotizar as crianças, adolescentes e jovens,
destruiremos a família monogâmica patriarcal.” (extrato do
artigo de Pedro Morais Vaz, no Observador de 14-03-2019)
Este
risco é real, vai afectar quase todos e vai também afectar a Igreja, pois os
futuros padres serão filhos desta realidade.
O
terreno fértil para a propagação destas ideologias foi, espante-se, trabalhado
em casa, porque deixamos de falar do Céu e do Reino de Deus. Deixamos de propor
Jesus Cristo, Ele deixou de fazer parte das nossas vidas.
Fala-se
de Igreja e da Igreja mas não se fala de Cristo. É sendo imagem d’Ele que os
nossos filhos poderão ter a resiliência suficiente para aguentar as investidas
do mal, tendo argumentos do Céu para responder às provocações da Terra.
Mas
este viver no Céu (não nas nuvens!) é a única forma de sermos felizes, de
aguentarmos um mundo e uma vida a cada dia mais complicada e complexa.
Nunca
como dantes temos coisas “boas” e que nos permitem ser “felizes”: o aborto, a
eutanásia (em breve legalizada), o divórcio, as uniões de facto...e um sem
número de coisas mais. Mas se assim fosse, fica-me a inquietação: porque não
somos então felizes? Porque nos afundamos cada vez mais nas depressões, nas
violências, nos abusos? Temos os direitos que “escolhemos” e isso não nos
satisfaz. E que deveres se opõe a estes direitos? É porque não há direitos sem
deveres.
Lembro-me
da fábula do Pinóquio, escrita por Carlo Collodi, em 1883, onde ele já nessa
altura antevia a perigosidade das falsas felicidades, dos direitos sem deveres.
A determinada altura da história, Pinóquio é persuadido com “boas” propostas e
“bons” argumentos a ir para a terra da felicidade. Lá, eram aparentemente felizes,
mas rapidamente começaram a perder identidade e foram transformados em burros.
Mas
como sair desta situação? Como inverter uma marcha que parece destinada à
vitória?
Não
tenho receitas, mas sei que somente um regresso ao Céu, origem e fonte da nossa
esperança, personificado em Cristo, e mutuamente nos ajudando seremos capazes
da criatividade que já há muito esquecemos. “Deus criou o ser humano à sua
imagem, criu-o à imagem de Deus; Ele os criou homem e mulher (Gn 1, 27) (…) e vendo a sua obra considerou-a muito boa (Gn 1, 31)”.
Uma
caminhada tem milhões de passos, mas começa apenas com um. Se se sentiram
interpelados, venham ter com mais alguns pais que já deram este primeiro passo
e juntem-se no caminho.
Apareçam
dia 10 de Abril às 21h30 no Centro Pastoral de Famalicão.
Até lá,
não se esqueçam, falem do Céu aos vossos filhos!
Por José Manuel Filgueiras
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