A Igreja é chamada a fazer «diaconia» no «continente digital»


«Educar os ritmos quotidianos, um tempo de imersão, um tempo de desconexão?» foi o tema que Gemma Serrano, diretora do Departamento do Humanismo digital do College des Bernardins, em Paris, trouxe à quarta edição da formação «Do Clique ao Toque» que hoje termina, em Braga.

A professora desafiou os docentes, em ligação com a família, acerca da importância de “ensinar a estar com os ecrãs” pois, segundo apontou, existe tempo de imersão e de desconexão”:
“Hoje ainda temos a tentação de proibir ou limitar o acesso como pais e educadores. Vemos até essa tendência na Califórnia ou em frança. Existem até conceitos de férias se «WIFI» e férias sem email”, constatou.
Para Gemma Serrano os educadores, nos vários âmbitos, devem colocar “uma questão de fundo: como nos relacionamos com estes dispositivos e de que modo o tempo que temos é usado para a conexão e a desconexão?”.
A aparecente dicotomia entre o online e o offline traz à tona o problema de se considerar “o ambiente digital”, como um verdadeiro “habitat quotidiano”:
“Parece-me hoje claro que o ambiente digital também é quotidiano e que o humano apenas transita, ao longo do dia, de ambiente em ambiente desenvolvendo, em cada lugar, papeis diferenciados e cada vez mais complexos compreendidos entre o «decorar», o tempo que despendemos a apreciar, a ver, e o «domesticar», que é o tempo em que agimos de modo a aprendermos e nos acostumamos a uma nova realidade”.
A Igreja, o «continente digital» e a diaconia na cultura
A diretora do departamento do Humanismo digital no College des Bernadines, em Paris, considera que, em termos teóricos, a Igreja “tem estado presente e ativa neste novo lugar do humano:
“Os Papa recentes tem escrito sobre a questão do virtual, os vários papeis aí desempenhados, os desafios que se colocam à inteligência da fé”.
Para a especialista “quando dizemos que existem estes dois mundos não estamos a perceber que a rede é um autêntico «continente digital» como nos dizia Bento XVI”.
“Não existem dois espaços. Existem ações quotidianas. Aí e aqui a igreja é «convidada a exercer uma diaconia na cultura digital». Hoje precisamos de fazer um trabalho na teologia a este nível como verdadeiro serviço de inculturação da fé”, considerou.
O desafio dos professores no século XXI
Considerando que “a família e a escola” como dois dos lugares da educação “da presença de cada um nos mundos possíveis” Gemma Serrano sustentou que “mais do que estar fisicamente presente e socialmente ausente, o estar ou não conectados, não nos fala da qualidade da nossa presença”.
Deste modo torna-se necessária uma “desimersão” ao invés de “uma desconexão”:
“Não se trata de se desconectar. Consiste em criar a capacidade crítica em todas as nossas presenças. Uma capacidade de análise de como podemos «decorar», mas produzir conteúdos percecionando que marca deixamos. Trata-se de discernir e refletir sobre o que se pode fazer”.
Assim a educação escolar deve “dar os instrumentos necessários para que os mais novos e nós possam viver de uma maneira responsável e critica perante a presença em tantos espaços”.
A Interioridade, os ritmos, os afetos e a solidão
Consciente de que o «continente digital» traz ao humano a possibilidade de “fazer vários papeis em diferentes lugares”, a especialista apontou a necessidade de ensinar a “ritmar a presença e os afetos”.
“Nietzsche afirma que somos «um conjunto de máscaras». Todos nós usamos papeis a partir dos quais falamos. O verdadeiro homem, para ele, será aquele que consegue viver todos estes papeis. Hoje podemos fazê-lo com um Avatar”, apontou.
 “Estes ambientes dão-nos a possibilidade de mudar de papel. De metamorfoses continuas do eu. Pode ser oportunidade para refletir sobres os diferentes papeis que desempenham”.
“O trabalho de desimersão pode ser o de ajudar de distinguir a função e o conteúdo destas identidades. Ter em conta as práticas digitais dos alunos e perguntar-lhes «quem sou na rede» mas quais são as vossas diferentes práticas. Qual o vosso envolvimento e que diz isso de ti”.
O papel da EMRC na educação do Ser Humano do Futuro
No final da sua reflexão Gemma Serrano considerou que os docentes de EMRC tem um papel fundamental no “questionar e fazer refletir os mais novos na qualidade das suas presenças e nos vários papeis que desempenham no dia a dia”:
“Existem muitas questões que como professores podemos colocar: Que tipo de relação se mantém com esta inteligência artificial. Como se trabalha a emoção? Como se educa a solidão?  Como se discerne as emoções?
“A Sagrada escritura está cheia de emoções e a inteligência da fé, até mais do que a Teologia, a própria tradição tem recursos completos para fazer estas leituras e ajudar a este discernimento”, completou.
A IV Edição «Do Clique ao Toque» é uma organização da UCP - Centro Regional de Braga, e reflete sobre os desafios do «universo digital» e a sua relação com a educação.
Os participantes vão escutar, ainda durante a manhã Ana Amélia Carvalho sobre os «desafios do professor na era da mobilidade».

Educris|09.02.2019

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