1. Recolocar a grande questão do sentido
Ao ignorar as múltiplas dimensões religiosas da cultura, torna-se opaca a nossa civilização, cuja matriz é o cristianismo, conjugado com a herança greco-latina. Uma «mutilação intelectual» que fez cair o nível cultural global dos alunos. Com efeito, ao interditar a colocação da grande questão do sentido (o «porquê»), ocorreu um acantonamento no «como», na esterilidade da tecnocracia. Adeus aos conhecimentos (saber com), bem-vindo mundo das competências (os métodos, os procedimentos, que garantem mais a empregabilidade a curto prazo do que o crescimento humano.
Escreve Simone Weil: «Faz-se mal a uma criança quando é criada num cristianismo estreito que a impede de ser capaz de perceber que existem tesouros de ouro puro nas civilizações não cristãs. A educação laica faz ainda pior. Ela dissimula esses tesouros e ainda os do cristianismo».
2. Ser claro sobre a laicidade
No plano político a laicidade supõe a neutralidade do Estado (separação dos poderes religiosos e políticos). No plano antropológico, a liberdade de consciência, que implica praticar um culto ou não crer. O termo “laico” pertence ao vocabulário cristão, designando o cidadão que não faz parte do clero. É a tradição bíblica que estabelece a possibilidade de uma distinção entre os poderes: antes mesmo do «dai a César o que é de César» pronunciado por Cristo, a figura do profeta relativiza e contrabalança a do rei.
Quando a Igreja intervém no debate público, dirige-se à inteligência dos seres humanos em busca da verdade «independentemente de toda a “crença” prévia». Os educadores não devem deixar-se intimidar pelas derivas de textos que separam a noção de laicidade num díptico, posicionando num lado «a razão (ordem das certezas universais, próprias do espaço público) e a religião (ordem das crenças particulares, próprias do espaço privado). Trata-se de uma forma astuta de decretar que «a única posição metafísica racional seria o ateísmo, o que não tem nada de neutro».
Esta escamoteamento faz-se muitas vezes à custa de uma grande mentira, silenciando capítulos inteiros da cultura universal emanados de pensadores cristãos. É preciso sair do círculo imparável das querelas de redutos, assumindo as violências e os excessos de todos os lados. O joio mistura-se sempre com o trigo.
3. Voltar à narrativa bíblica
Os católicos leem pouco a Bíblia e não são formados para entrar no Livro. Uma constatação que se tolera com demasiada facilidade, ignorando que esta desafetação é «uma verdadeira amputação da Palavra» que tem pesadas consequências na cultura católica: a perda da consciência histórica (a Bíblia inaugura um tempo linear, em rutura com os mitos antigos), o desenraizamento, com o risco de «desincarnar Jesus da história dos seres humanos, reduzindo-o a um mito».
Ignorar as Escrituras acarreta igualmente a perda da cultura da interpretação, a capacidade de entrar na leitura alegórica, de cada católico se inscrever ele mesmo nessa narrativa através da qual pode «decifrar a sua própria história».
Por outro lado, a Bíblia guarda tesouros que iluminam a natureza do ser humano e o seu destino, «porque assume e coloca em cena as grandes paixões humanas, o amor, o mal, a fraternidade, a filiação, o desejo, dos mais sublimes aos mais sórdidos, sem moralismo, mas iluminando o coração humano».
Ao ignorar as múltiplas dimensões religiosas da cultura, torna-se opaca a nossa civilização, cuja matriz é o cristianismo, conjugado com a herança greco-latina. Uma «mutilação intelectual» que fez cair o nível cultural global dos alunos. Com efeito, ao interditar a colocação da grande questão do sentido (o «porquê»), ocorreu um acantonamento no «como», na esterilidade da tecnocracia. Adeus aos conhecimentos (saber com), bem-vindo mundo das competências (os métodos, os procedimentos, que garantem mais a empregabilidade a curto prazo do que o crescimento humano.
Escreve Simone Weil: «Faz-se mal a uma criança quando é criada num cristianismo estreito que a impede de ser capaz de perceber que existem tesouros de ouro puro nas civilizações não cristãs. A educação laica faz ainda pior. Ela dissimula esses tesouros e ainda os do cristianismo».
2. Ser claro sobre a laicidade
No plano político a laicidade supõe a neutralidade do Estado (separação dos poderes religiosos e políticos). No plano antropológico, a liberdade de consciência, que implica praticar um culto ou não crer. O termo “laico” pertence ao vocabulário cristão, designando o cidadão que não faz parte do clero. É a tradição bíblica que estabelece a possibilidade de uma distinção entre os poderes: antes mesmo do «dai a César o que é de César» pronunciado por Cristo, a figura do profeta relativiza e contrabalança a do rei.
Quando a Igreja intervém no debate público, dirige-se à inteligência dos seres humanos em busca da verdade «independentemente de toda a “crença” prévia». Os educadores não devem deixar-se intimidar pelas derivas de textos que separam a noção de laicidade num díptico, posicionando num lado «a razão (ordem das certezas universais, próprias do espaço público) e a religião (ordem das crenças particulares, próprias do espaço privado). Trata-se de uma forma astuta de decretar que «a única posição metafísica racional seria o ateísmo, o que não tem nada de neutro».
Esta escamoteamento faz-se muitas vezes à custa de uma grande mentira, silenciando capítulos inteiros da cultura universal emanados de pensadores cristãos. É preciso sair do círculo imparável das querelas de redutos, assumindo as violências e os excessos de todos os lados. O joio mistura-se sempre com o trigo.
3. Voltar à narrativa bíblica
Os católicos leem pouco a Bíblia e não são formados para entrar no Livro. Uma constatação que se tolera com demasiada facilidade, ignorando que esta desafetação é «uma verdadeira amputação da Palavra» que tem pesadas consequências na cultura católica: a perda da consciência histórica (a Bíblia inaugura um tempo linear, em rutura com os mitos antigos), o desenraizamento, com o risco de «desincarnar Jesus da história dos seres humanos, reduzindo-o a um mito».
Ignorar as Escrituras acarreta igualmente a perda da cultura da interpretação, a capacidade de entrar na leitura alegórica, de cada católico se inscrever ele mesmo nessa narrativa através da qual pode «decifrar a sua própria história».
Por outro lado, a Bíblia guarda tesouros que iluminam a natureza do ser humano e o seu destino, «porque assume e coloca em cena as grandes paixões humanas, o amor, o mal, a fraternidade, a filiação, o desejo, dos mais sublimes aos mais sórdidos, sem moralismo, mas iluminando o coração humano».
Texto de Clotilde Hamon a partir do livro “Dieu à l’école”, de Xavier Dufour
In Famille Chrétienne
Trad.: Rui Jorge Martins
Imagem: dolgachov/Bigstock.com
Publicado em 05.09.2018
In Famille Chrétienne
Trad.: Rui Jorge Martins
Imagem: dolgachov/Bigstock.com
Publicado em 05.09.2018
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