Padre José
Nuno Ferreira da Silva, capelão durante 18 anos do Hospital são João no
Porto, doutorado em bioética e professor, defende que quem professa uma
religião tem de agir no debate sobre a morte assistida.
O
presidente francês disse-o há dias e ontem um dos oradores da
conferência sobre Como Cuidar com Compaixão repetiu-o para a audiência
que estava presente no salão da Academia de Ciências de Lisboa. "Estou
aqui para vos dizer que a República espera muito de vós, e espera de vós
três dons: sabedoria, compromisso e liberdade." A mensagem estava
lançada pelo padre José Nuno Ferreira da Silva sobre o que todos os que
ali estavam e que integram comunidades religiosas têm de fazer perante o
debate que está a ser desenvolvido na sociedade portuguesa sobre a
morte assistida.
"A intervenção é necessária", disse. "Este é o contributo que a sociedade precisa de receber das comunidades. Temos de intervir, temos liberdade para intervir, se não o fizermos há coisas que ficarão comprometidas", disse o sacerdote, que foi capelão durante 18 anos no Hospital São João, no Porto, professor e doutorado em bioética.
José
Nuno Ferreira da Silva falava na conferência organizada pelo grupo de
trabalho Inter-Religioso - Saúde, que reúne evangelistas, judeus,
hindus, muçulmanos, católicos, ortodoxos, budistas e adventistas, e
alertou para o facto de "não podermos ser dogmáticos nem fundamentalistas".
"Mas o que temos de fazer, temos de o fazer",
disse, acrescentando: "Somos herdeiros e sujeitos de uma sabedoria que
vem de sempre." No seu discurso evocou a ética e o facto de a bioética
não poder estar dissociada do debate sobre a "vida do homem. Pode ser
grave se não estiver presente", argumentou. "As religiões não
têm o monopólio da verdade. O seu discurso é um serviço e não podemos
pretender que seja entendido como uma verdade categórica, mas as
comunidades religiosas devem reivindicar a liberdade da religião para
participar no debate; assumamos a humildade na forma de o fazer."
O
sacerdote defendeu que vivemos na sociedade da direitocracia, mas além
dos direitos há deveres e não se pode "não falar de deveres quando todos
deixam de o fazer". E "nós, religiões, temos de o fazer".
Durante
pouco mais de duas horas, José Nuno Ferreira da Silva e o advogado
Fernando Loja dissertaram sobre a necessidade da intervenção no debate
sobre a morte assistida. Quiseram deixar algumas certezas, como "a do
direito de as igrejas, comunidades e religiões terem um lugar no debate
político" - direito que lhes é dado pela herança da tradição e pela
própria Lei da Liberdade Religiosa. Mas também deixaram apelos,
intervenção, intervenção... e uma reflexão: "Podemos aceitar uma medida legislativa que, em nome do sofrimento intolerável, vai abrir a porta a muito mais sofrimento?"
Uma última certeza foi deixada: a de que o dia de ontem foi histórico,
aquele que uniu várias confissões religiosas para assinarem uma
declaração contra a eutanásia. O documento será entregue à Presidência
da República e ao Parlamento. No final, um a um, os líderes religiosos
confirmaram porque é que à luz das suas convicções não aceitam a
legalização da eutanásia.
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