«A maior parte dos luxos e muitas das chamadas comodidades não
só não são indispensáveis, como são, pelo contrário, verdadeiros
obstáculos ao progresso da humanidade.»
Conta-se que Sócrates ia para o meio das mercadorias e produtos
oferecidos pelo mercado de Atenas para exclamar, satisfeito: «De
quantas coisas não tenho absolutamente necessidade».
A sociedade moderna levou-nos, com o seu consumismo, a um nível
altíssimo de necessidades não necessárias. Muitas “comodidades” são
absolutamente exorbitantes, apenas úteis para enriquecer quem as produz e
se destaca na habilidade de convencer-nos que sem elas não podemos
viver decorosamente.
É este também o pensamento expresso pelo escritor americano
Henry David Thoreau (1817-1862), na sua obra “Walden ou a vida nos
bosques” [editado em Portugal pela Antígona], espécie de diário da sua
vida durante dois anos sozinho numa cabana junto ao lago de Walden, no
Massachusetts.
É verdade que pode também haver uma retórica da vida na
natureza, primitiva e solitária, e talvez o próprio Thoreau seja algo
indulgente em relação a ela.
Todavia, a lógica frenética dos consumos, a publicidade
comercial marteladora, a preguiça e o prazer sem esforço encheram-nos de
produtos que impelem para fora de nós mesmos a nossa, o compromisso, a
sobriedade, a generosidade.
O estilo clássico da Quaresma era o da separação, da renúncia,
da abstinência, do jejum. Agora, no máximo, conhece-se a dieta mas
ignora-se o domínio de si, o essencial, a purificação do espírito da
posse e da acumulação.
Um autêntico progresso moral ocorre quando nos libertamos das
escórias, dos adornos, das comodidades inúteis. O apego às coisas
torna-nos não só pesados fisicamente, mas pesados na mente e no
coração, extinguindo a leveza e a liberdade da alma.
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