Sim, depois de oito anos, depois da crise dos sete anos (crise? qual
crise, se gostamos tanto um do outro?), numa altura em que amigos e
familiares próximos se chateiam e separam um do outro, uns atrás dos
outros, continuamos casados.
Porque, por mais incrível que pareça,
gostamos mesmo um do outro. E não, ainda não tivemos um “acidentezinho”
ou uma “doençazinha” que nos castigue por este amor continuado, o café e
um beijo na cama pela manhã, um filme no sofá enquanto nos abraçamos à
noite, e sim, esta relação, a nossa relação, isto que nós os dois
construímos, fruto de tantos anos, tantos sacrifícios, tanto sangue
perdido por entre as mãos e por entre a terra, mete mesmo nojo. Não
porque o façamos de propósito, não fazemos, mas não tendo mais ninguém,
estando tão longe de tudo e de todos, só nos temos um ao outro na
alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza em
todos os dias da nossa vida, até que a morte nos separe.
Por isso continuamos casados. Mais. Porque fazemos coisas em
conjunto, viajamos juntos, dormimos juntos, comemos juntos, planeamos
juntos, construímos uma casa juntos, vivemos juntos. Afinal, e se bem me
lembro, foi por isso que casámos, para que possamos, juntos, morrer
juntos, daqui por muitos anos e depois de muitos anos, um pé de roseira e
as nossas cinzas unas, indistintas, agora e para sempre.
O segredo? Voltem a ler o parágrafo anterior. E o diálogo, não
esquecer o diálogo, a conversa, como é bom falar, planear, sonhar,
deitar tudo cá para fora e dizer que te amo de repente, quando menos
estás à espera, sem esquecer aquelas pequenas surpresas, aqueles
pequenos presentes, flores à tua espera em casa, a refeição que se
cozinha quando o outro está cansado, os teus olhos nos teus anos ou
aquela prenda pelo Natal que mais ninguém compreende para além de ti,
para além de nós.
O segredo? Voltem a ler os dois parágrafos anteriores. A relação, o
tempo, a presença, o apoio, ouvir, beijar, abraçar, segurar-te,
segurar-me para não cairmos, os risos e as lágrimas, as lágrimas de
tanto rir, a rotina dos dias que urge quebrar, fugir e partir para parte
incerta, os teus lábios e os meus e o vento como testemunha única do
que não vos vou contar.
Sim, contra as minhas expectativas, eu que nem queria casar com medo
do divórcio, dos gritos, insultos e murros de outras vidas, de outras
histórias, ainda estou casado. O dia do casamento é a partilha do amor
que nos une com todos os que nos rodeiam e amam. Disseram-me que no
nosso casamento as ostras estavam óptimas. Nunca as vi, nunca as vimos,
quanto mais comê-las. Fica para a próxima, no vosso casamento, quando
vocês prometerem como nós prometemos à frente dos teus pais e dos meus,
do teu irmão e das minhas irmãs, do meu avô e da minha avó, dos teus
primos e dos nossos amigos, casar, viver e amar até que aquela
“doençazinha” ou “acidentezinho” nos separe, para gáudio de todos os que
nunca perceberam o que porra significa estar casado.
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