A pequena urna branca está diante do altar. A igreja repleta de gente, num silêncio atónito e comovido. Uma multidão de amigos aperta-se junto aos pais de Pedro Maria Adeodato, morto na barriga da mãe poucas semanas antes do termo da gravidez. Chamaram-no assim, colocando-lhe o nome do grande amigo de Jesus, o da Virgem e um terceiro que significa "dado por Deus". Um dom que os pais não quiseram renunciar depois de os médicos terem diagnosticado uma grave malformação incompatível com a vida. E assim viveram sete meses, rezando e esperando, pedindo o milagre da cura a par do da conversão do coração? Porque é que pôde acontecer? Que sentido tem uma morte tão atroz? Apetece dizer que não há palavras para responder.
E todavia, há. São as palavras que a graça de Deus colocou na boca dos pais e que se depositam de maneira indelével no coração de quem participou num funeral difícil de esquecer. Quando souberam do infeliz diagnóstico, o pai e a mãe escreveram aos amigos uma carta que encerra o sentido do que estava a acontecer e que lhes permitiu viver o tempo da espera com a consciência de que somos feitos - todos - para um destino bom, uma consciência que talvez eles próprios não imaginavam poder ter. «É-nos pedido um sacrifício. Ou seja, tornar sagrado a nossa relação com o Pedro, o que quer dizer vê-lo como o vê Deus: com virgindade. Este sacrifício é uma responsabilidade enorme quanto à nossa fé e à nossa vida. Ser tocados pela graça é isto: ver as coisas como Cristo.
«Quer vivamos, quer morramos, somos do Senhor»: o excerto de S. Paulo que é lido do púlpito descreve a posição vertiginosa que os pais do pequeno Pedro puderam ter nestes meses de ansiosa expetativa, pela graça de Deus mais do que por um heroísmo impossível.
Às vezes o Mistério toca-te com uma carícia (como quando nós dois nos conhecemos), outras vezes de maneira mais decisiva e com traços violentos. Ver uma coisa com virgindade pede-te, antes de tudo, que perguntes e verifiques onde está o teu coração, o teu centro afetivo: onde está a tua felicidade. Parece por vezes dado como adquirido dizer que a felicidade está em Cristo. No nosso caso não o é por nada: a nós é pedido reconhecer que a nossa felicidade não está no Pedro, mas em Jesus. Não está em jogo apenas o nosso filho, mas a relação com Ele. Uma amizade que nos pede tudo.»
A eles, verdadeiramente, foi pedido tudo, um "sim" total e incondicional. Por isso decidiram celebrar o funeral na mesma igreja onde alguns anos antes se tinham unido em matrimónio, proclamando um "sim" que os ligava para toda a vida. E aquela igreja - por uma coincidência que diz muito das dinâmicas misteriosas que movem a existência - é dedicada a S. Pedro, o mesmo nome que acompanharam num percurso misterioso, confiando-se a um Outro. Reconhecer que a vida é um mistério nas mãos de um Outro é a única maneira para dar-se razões do que aconteceu.
A fé fá-lo intuir mesmo dentro de uma dor inenarrável, que chegar até a experimentar a abrasividade da morte. «Quer vivamos, quer morramos, somos do Senhor»: o excerto de S. Paulo que é lido do púlpito descreve a posição vertiginosa que os pais do pequeno Pedro puderam ter nestes meses de ansiosa expetativa, pela graça de Deus mais do que por um heroísmo impossível. Quando o funeral termina e se abrem as portas da igreja, um raio de sol pousa levemente sobre os presentes.
É um sinal, inesperado, que parece evocar as palavras de um canto entoado pouco antes: «Não vos rendais à escuridão que as coisas devora, agora é noite mas o dia virá, ainda». Num mundo que vive no ceticismo e que deixou de saber dar-se as razões para viver, pode acontecer descobrir estas razões quando se está diante da morte. Podem acontecer coisas como estas, num funeral. Coisas do outro mundo. Neste mundo.
Giorgio Paolucci
In "Avvenire"
Trad.: SNPC Publicado em 29.03.2017
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