Nova carta semanal
do arcebispo de Madri, dom Carlos Osoro Sierra. Publicamos a seguir o texto na
íntegra.
Neste
mês de novembro, quando recordamos tantas pessoas que tiveram protagonismo
especial em nossa vida, e depois de vivermos o Sínodo da Família, é imperativo,
no mais profundo do meu coração, falar da família, da família em que eu,
pessoalmente, experimentei e aprendi o melhor da minha vida. Não posso esquecer
a família, que é a estrutura fundamental de todas as culturas e em todos os
tempos. Na história da minha vida, foi crucial contemplar a Família de Nazaré,
em que Deus mesmo viveu e através da qual se fez presente neste mundo,
revelando-nos o rosto humano que, se quisermos viver e construir a cultura do
encontro, todos temos de ter. Dou graças a Deus por ter-se aproximado da nossa
vida dessa maneira. Deus se fez homem: “O Verbo se fez homem e habitou entre
nós” (Jo 1, 14). Em Jesus Cristo vemos o homem: como ele pode ser e como Deus
quer que ele seja. É na família que começa a se desenvolver a verdade sobre o
homem. E quando a instituição familiar é pressionada de diversas formas para se
acomodar a conveniências e não à verdade, isto não pode ser chamado de
progresso da humanidade, mas de mentira instaurada na civilização. A história
não é simplesmente um progresso necessário rumo ao melhor, e sim um
acontecimento de liberdade ou um combate entre liberdades que se opõem; como
dizia Santo Agostinho, um conflito entre dois amores: o amor de Deus até o
desprezo de si mesmo e o amor de si mesmo até o desprezo de Deus.
Matrimônio
e família estão unidos à dignidade pessoal do homem. Eles não se derivam do
instinto e da paixão, nem exclusivamente do sentimento; derivam, antes de tudo,
de uma decisão livre da vontade, de um amor pessoal que torna os esposos uma só
carne, um só coração e uma só alma. O matrimônio é orientado ao futuro, é o
único lugar idôneo para a geração e para a educação dos filhos; por isso, em
sua essência, ele é orientado à fecundidade, a criarmos a cultura da vida como
colaboradores do amor criador de Deus. A regra estabelecida para os processos
da vida deve ser respeitada. Não se pode qualificar uma sociedade de
progressista se ela não respeita esses processos; do contrário, faremos uma
sociedade de olhos fechados para o futuro. Não respeitar os processos da vida
em sua essência é levar à cultura da morte, com processos parecidos e até mais
dissimulados, como temos vivido em tempos recentes na Europa.
A
família, fundada e vivificada pelo amor, é uma comunidade de pessoas: do homem
e da mulher, esposos e pais, e dos filhos. Remontar ao princípio, ao gesto
criador de Deus, é uma necessidade para a família se ela quer se conhecer e
realizar segundo a verdade interior do seu ser e da sua ação histórica. Quero
fazer três afirmações ao contemplar esse gesto criador de Deus:
1.
Creio na família: Sim, creio nesta comunidade de pessoas. A vida humana surge
de pai e mãe. Negar um deles é negar a vida. Todo homem nasce de pai e mãe e
cada um deles é indivisível do único ser que somos. Não se pode surgir
fisicamente sem pai e mãe. São princípios físicos de existência, princípios
pessoais de constituição e princípios simbólicos e psicológicos de
identificação do ser humano como ser com sentido no mundo. Duas palavras
sagradas para o ser humano, pai e mãe, com um conteúdo especial. Negar ou
diluir pai e mãe é um ataque à própria essência da vida.
2.
Espero na família: Sim, na família que recebeu a missão de custodiar, revelar e
comunicar o amor. Como nos disse São João Paulo II, “o homem não pode viver sem
amor. Permanece para si mesmo como um ser incompreensível; sua vida é privada
de sentido se não lhe é revelado o amor, se ele não se encontra com o amor, se
não o experimenta e não o torna próprio, se não participa dele vivamente” (RH
10). O papa Francisco nos insistiu que este amor tem a sua realização mais
profunda no amor do homem e da mulher no matrimônio, e, de forma mais ampla,
entre os membros da mesma família. O compromisso fundamental da família é o
serviço à vida, com o qual ela promove, instaura e serve à cultura da vida. O
matrimônio formado pelo homem e pela mulher, início singular da família, é a
essência da cultura da vida e, portanto, do futuro da humanidade.
3.
Amor à família: Como não amar a família se nela e dela recebemos o melhor que
temos, que é a vida mesma? “Deus, com a criação do homem e da mulher à sua
imagem e semelhança, coroa e leva à perfeição a obra de suas mãos; Ele os chama
a uma especial participação no seu amor e, ao mesmo tempo, no seu poder de
Criador e Pai, mediante a sua cooperação livre e responsável na transmissão do
dom da vida” (FC 28). Enfrentar o caminho da vocação matrimonial e familiar
significa aprender o amor conjugal dia a dia, ano após ano, o amor em alma e
corpo, o amor que é “paciente e bondoso, que não busca seu interesse (...), não
tem medo do mal”. O amor “encontra sua alegria na verdade”, o amor “tudo
suporta” (I Cor 13). Não deixemos que nos roubem e arrebatem a riqueza da
família. Não incluamos em nosso projeto de vida um conteúdo deformado,
empobrecido. “O amor se alegra com a verdade”. Busquemos a verdade do
matrimônio e da família onde ela se encontra; cada um de nós é verificação
dessa verdade. Estejamos dispostos a buscar a verdade da família no amor
misericordioso, que, com tanta força, nos foi revelado por Jesus Cristo; esta
deve ser a nossa paixão. E não caiamos na corrente das opiniões em que se
desvia do amor de Cristo, que é misericordioso e sempre instaura caminhos para
defender a verdade do homem, cuja revelação também se dá na família. Isto é
converter o amor em amor verdadeiro.
Na
Família de Nazaré encontramos os argumentos necessários para dizer que a
família é uma realidade sagrada. E que pai e mãe são as palavras mais belas
porque falam da verdade do homem e da mulher que geram vida e prolongam o amor
de Deus. Nós, surgidos à vida necessariamente por meio de pai e mãe, não somos
um acréscimo externo ao amor mútuo dos nossos pais: nós brotamos do próprio
coração da sua doação recíproca, sendo seu fruto e seu cumprimento. Creiam na
família. Como lhes disse em outras ocasiões, a família é a “escola de belas
artes” mais importante na vida do ser humano; aquela em que a beleza mais
intensa se revela ao homem.
Com
grande afeto e a minha bênção,
+
Carlos, arcebispo de Madri
(12
de Novembro de 2015)
in http://www.zenit.org/pt/articles/a-verdade-sobre-o-homem-comeca-na-familia?utm_campaign=diarioportughtml&utm_content=%5bZP151112%5d%20O%20mundo%20visto%20de%20Roma&utm_medium=email&utm_source=dispatch&utm_term=Image
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