Não a
encontravam há dez dias. Uma conhecida procurou-a obstinadamente, examinando
uma a uma as divisões do hospital onde alguém dizia tê-la visto. Por fim,
encontrou-a à entrada das urgências, envolvida por uma manta, numa maca, muito
suja e desnutrida.
Os vizinhos
tinham assinalado o desaparecimento e havia sido emitido um alerta por parte
dos serviços sociais do município, que no passado tinham insistido para que a
senhora fosse viver para uma instituição para idosos, já selecionada. Mas, com
quase 90 anos, ela não queria saber e continuou a viver só, na sua casa.
Antes que
alguém a deitasse naquela maca, provavelmente andou dias e dias entre as
divisões do hospital, que considera como a sua segunda casa. Parece que o ligeiro
estado de ansiedade em que a encontraram não teria sido suficiente para
justificar um internamento. Dizemos “provavelmente” e “parece” porque ninguém
sabe ao certo o que aconteceu, porque ninguém se deu verdadeiramente conta
dela, nem quando e como caiu e feriu um olho. E quem, a determinado momento, a
encontrou na maca, não se deu conta do estado em que estava, ou talvez, quem
sabe, ter-se-á dedicado a outras urgências, casos mais graves, e continuou a
deixá-la à espera.
Desperta uma
imensa ternura e piedade pensar nesta mulher que a velhice tornou
substancialmente invisível. Podemos imaginá-la a vaguear, algo confusa, entre
as salas, a aguardar em vão nas salas de espera, com aquele ar de resignação
paciente de tantos dos nossos idosos que aprenderam o quanto é inútil ter
pressa. Talvez tenha feito perguntas, ou até, em silêncio, se tenha
instintivamente confiado à familiaridade do lugar, tranquilizada por ver
determinados rostos. O certo é que muitos a olharam sem a ver verdadeiramente,
como se fosse transparente. Uma sombra.
Não se trata
da marginalização do “diferente” – o estrangeiro, o sem-teto –, mas da
estranheza do nosso próximo, de quem é igual a nós, de quem poderia ser a nossa
mãe, a nossa avó, de quem nos recorda que, se não se morre jovem, todos nos
tornaremos assim. Mas aquela senhora não era a mãe nem a avó de ninguém. Foi ao
hospital sozinha porque não tem família – à parte uma irmã, mais velha, que
vive noutra região, e aqui reside a questão: por muito eficientes que as
estruturas de saúde e sociais possam ser, por muito que as leis e os
regulamentos sejam rigorosos, uma rede institucional de proteção e de cuidado
nunca poderá substituir plenamente a força das relações familiares.
Idosos,
crianças, deficientes, doentes: o cuidado da fragilidade humana precisa de uma
rede de solidariedade de tipo familiar, e não pode ser totalmente delegada nem
sequer nas organizações mais eficientes. Os próprios “cuidados domiciliários”,
que o nosso sistema justamente procura promover, pressupõem geralmente que em
casa haja alguém, além do paciente, e que seja capaz pelo menos de estar junto
dele com consciência e atenção.
Uma
sociedade que não se dá conta da importância da família e da urgência de a
proteger e apoiar, antes de tudo enquanto bem para todos, é uma sociedade
destinada a desaparecer, que começa a tornar-se uma soma de indivíduos sós e
frágeis, como aquela velha senhora perdida dentro do seu hospital.
Assuntina
Morresi - In
"Avvenire"
Trad. /
edição: Rui Jorge Martins
Publicado em
11.02.2015
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