Tudo
na vida tem o seu tempo com fases de intensidade diferentes. Nascer, crescer,
viver e morrer marcam tempos de vida aos quais vamos atribuindo memórias que,
não raro, podem cair na vulgaridade. Mas memórias são passado. No caso
específico do Natal, a vulgaridade vai aparecendo espelhada num frio
materialismo que, não só esquece as nossas memórias como, também, nos faz
mergulhar na sede de um hoje de "compra, usa e deita fora".
Neste
hoje, infelizmente o Natal vai-se tornando não raro numa celebração fictícia ou
destituída de significado para muitos dos adultos que se afirmam cristãos, que
já o viveram de modos muito diferenciados e, agora, quase e apenas o
"suportam" em nome das crianças mais pequeninas. Como quer que seja,
a atividade comercial apropriou-se de tal modo do Natal que a exterioridade se
sobrepôs à interioridade. Sem interioridade...o homem arrefece. O verdadeiro
Natal vai, assim, secando no coração da nossa história.
Daí as marcas de
vulgaridade confrangedora que desenham a celebração natalícia em nome do
"deus dinheiro" que tudo compra num frenesim de clara pobreza.
Esqueceram-se as raízes e a razão do Natal, o mundo em que nasceu, a mensagem
que trouxe aos homens "de boa vontade" e, muito mais importante, o
que pretende ser no hoje da nossa história.
O
Natal nasceu no coração de uma família humana. Vindo da família do Deus trino,
o Verbo tornou-se o Emanuel -- Deus connosco no coração desta família humana.
Será curioso salientar a intervenção do poder que obrigou a um recenseamento, o
lugar (curral) onde se abrigaram José e Maria, a pobreza de uma manjedoura, um
corpo a tiritar de frio, o bafo de animais numa clara alusão às invenções dos
criadores de presépios, ou mesmo um conjunto de pormenores que os tempos vieram
a acrescentar a um presépio sonhado pelas luzes da ribalta e do fascínio, mas
não real. Esqueceu-se o núcleo do mistério: um Deus que quis nascer no seio de
uma família humana aberta ao mistério de Deus. A abertura ao mistério é
condição essencial para que o "faça-se em mim" de Maria torne
possível o nascimento segundo a carne do Filho de Deus. Mas, porque teria
Cristo querido nascer no seio de uma família? Não terá sido porque Ele quis que
ela se tornasse família de Deus? Então, Natal será verdadeiro quando acontecer
o "faça-se família" em mim no hoje da minha família.
Quando
esquecemos o essencial, sempre acrescentamos ramagens enganadoras (sempre
evitáveis) ao Natal dos homens e vamos esquecendo o Natal de um Deus que
pretende estar connosco no hoje da nossa história. Ora o hoje da nossa história
é transversal ao hoje da família humana, cujo coração nem sempre quer aceitar,
respeitar e reanimar o projeto de Deus que é família. Digamos que gostamos de
"embrulhar" o Natal na vulgaridade do individualismo em vez de o
tentarmos redescobrir na sua essencialidade mais radical: um Deus presente em
cada um de nós que, não sendo ilhas isoladas, somos elementos integrantes e
agentes de construção da família humana que quer ser família de Deus.
A
família assim vivida é terra semeada por Deus para que nela germinem não só os
filhos dos homens, mas também o Filho de Deus que quis ser irmão de todos os
homens no hoje da história. Aqui nasce o amor que irradia e é divinizado pela
presença d'Aquele que assumiu a mesma natureza dos filhos dos homens. Natal sem
amor é acontecimento inventado por quem se tornou impenetrável, por quem se
desligou da fonte donde brotou para todos a misericórdia e o perdão.
Natal
não está numa árvore iluminada, não está num presépio com figuras esculpidas,
não está no sonho de ser criança...mas está no coração de cada um de nós a dar
vida ao coração da família abençoada por Deus e contagiada pelos mesmos
sentimentos que existiam no Senhor Jesus.
A Equipa Arciprestal da Pastoral Familiar de VNF
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