A nossa diocese de Leiria-Fátima dedica um biénio à pastoral familiar
perante os novos desafios e na perspetiva da evangelização. Propusemo-nos dois
grandes objetivos: redescobrir e reconhecer como e quanto é bom, belo e feliz
formar uma família segundo o desígnio de Deus; e como e quanto isto é precioso
e indispensável para a vida das pessoas, da sociedade e da Igreja e para o
futuro da humanidade.
A nossa reflexão crente não pode limitar-se simplesmente a constatar a
crise que hoje atinge a família, a analisar os dados e, pior ainda, a ficar
parada junto ao muro das lamentações. A primeira urgência é sobretudo o
reconhecimento e o anúncio de que o Evangelho tem algo de importante e belo a
dizer hoje para a família (o Evangelho da família) e também de que a
instituição familiar é Evangelho, boa notícia para o mundo contemporâneo
enquanto realidade originária de amor como criatura de Deus-Amor. É, pois,
necessário que a comunidade cristã faça ressaltar a beleza e a dignidade da
família no contexto da vocação ao amor que toma uma forma específica no
matrimónio do qual surge a família. A esta finalidade dedicamos o primeiro ano
do biénio pastoral sob o lema “Amor conjugal: dom e vocação”.
A missão de ser “alma do mundo”
No presente ano pastoral vamos voltar-nos para a missão da família na
sociedade e na Igreja, sob o lema: “A Família: dom e missão”. Perante a
tentação atual de reduzir a família a lugar de afetos privados, é necessário
sublinhar a sua missão e a responsabilidade públicas, social e eclesial; tomar
consciência de que é um bem não só para o casal e os filhos, mas para todos.
Para apreciar verdadeiramente a realidade familiar, devemos reconhecê-la como
comunidade originária, isto é, o primeiro lugar em que a sociedade surge, se
desenvolve e se regenera continuamente.
Da família provém o capital humano, espiritual e social básico,
primário, de uma sociedade. Este capital é gerado pelas virtudes únicas e
insubstituíveis da família. Converte-se no fator decisivo do bem estar material
e espiritual das pessoas que contribuem para o funcionamento positivo da
sociedade e a tornam feliz, para o bem comum.
Neste sentido, a família está chamada a tornar-se “alma do mundo”
realizando a sua missão como escola primeira e sem igual de humanidade,
precisamente enquanto primeira escola de afetos que ajuda a crescer e
amadurecer a personalidade; como comunidade e escola de fé, lugar privilegiado
da primeira iniciação à fé; como berço da vida e escola de virtudes sociais, de
cidadania responsável. Trata-se de uma missão bela e árdua. Para a realizarem,
as famílias precisam naturalmente do apoio humano e espiritual por parte da
sociedade e da Igreja: de políticas sociais amigas da família, de uma pastoral
de acolhimento e acompanhamento, de animação e misericórdia.
É preciso promover uma pastoral capaz de estimular a participação da
família na sociedade, a recuperar o seu papel de sujeito social. “Neste
contexto, aparecem muitos desafios às famílias: a relação entre a família e o
mundo do trabalho, entre a família e a educação, a família e a saúde; a
capacidade de unir entre si as gerações de modo a não abandonar os jovens e os
idosos; o desenvolvimento de um direito de família que tenha em conta as suas
relações específicas; a promoção de leis justas que garantam a defesa da vida
humana e promovam a bondade social do matrimónio autêntico entre o homem e a
mulher” (Instrumento de Trabalho para o Sínodo dos Bispos, 34). Os governos
preferem ocupar-se dos cidadãos individuais e suas aspirações do que do bem da
família e suas necessidades.
Subsídios para reflexão e formação
Estes aspetos sobre a missão da família já foram apresentados na carta
pastoral que escrevi no ano passado “A beleza e a alegria de viver em Família”.
Este ano, publicamos um opúsculo com três contributos muito interessantes e
pertinentes para reflexão e formação. Podem ajudar as comunidades, os
departamentos e serviços diocesanos, os agentes pastorais a dinamizar e
concretizar mais as atividades do percurso pastoral já programado.
O primeiro contributo é uma Nota Pastoral da Conferência Episcopal
Portuguesa, “A força da família em tempos de crise” (11/04/2013). Ajuda a
descobrir o precioso e insubstituível “bem social” da família e é um apelo a
que esta “seja reconhecida e apoiada na missão social que só ela pode
desempenhar”. Um país que quer um futuro, tem necessidade de famílias sólidas e
com filhos.
Segue-se o texto duma catequese preparatória do VII Encontro Mundial das
Famílias, em Milão 2012, intitulada “A família anima a sociedade”. Trata o tema
com método e em termos mais catequéticos para ajudar a interiorizá-lo e a
vivê-lo no quotidiano.
Por fim, acrescentamos uma carta do então arcebispo de Milão em 2008,
Cardeal Dionísio Tettamanzi, dirigida aos casais em situação de separação,
divórcio e nova união, intitulada “O Senhor está próximo dos que têm o coração
ferido”. É um texto bem expressivo da “medicina de misericórdia” de Deus e da
respetiva pastoral da Igreja em relação a estas situações difíceis. Pretende
iluminar as comunidades cristãs na pastoral do acolhimento e ajudar a curar as
feridas das pessoas que foram atingidas por situações de rotura, ajudá-las a
caminhar na fé e a integrá-las na vida da comunidade cristã dentro das
possibilidades e dos limites da nova situação. “A medicina da misericórdia não
se destina a favorecer os naufrágios, mas sempre e só a salvar a barca no mar
tempestuoso e dar aos náufragos o acolhimento, o cuidado e o apoio necessários”
(Bruno Forte).
A família é uma “grande causa” para a Igreja e para a sociedade neste
momento de crise epocal. Pode ser o ponto de partida de uma sociedade, de uma
Igreja e de um mundo renovados. Merece, pois, e espera todo o nosso empenho, as
nossas melhores energias, a nossa confiança e a nossa oração. Vamos a isso com
coragem e entusiasmo, com criatividade e esperança!
† António Marto, Bispo de Leiria-Fátima
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