A
festa da Sagrada Família de Jesus, Maria e José é destinada a exaltar o facto
de o Filho de Deus, vindo à terra, ter querido também Ele fazer parte de uma
família. Deus reconhece, assim, que a família é o âmbito privilegiado em que
nasce e deve ser educado o homem e o cristão.
São
certamente grandes as diferenças entre a Sagrada Família e as nossas famílias:
na de Jesus, o pai é apenas pai legal, a mãe é virgem e o filho provém
diretamente de Deus. Nesse sentido, não é possível encontrar paralelos com a
família de Nazaré.
Contudo,
também esta família vive o quotidiano, como cada família, e nisso, pelo
contrário, é certamente um modelo de relações humanas positivas: ternura,
bondade, humildade, mansidão; são estas as características de uma vida
quotidiana construtiva e consoladora. Todavia, também a família de Nazaré teve
as suas cruzes e as suas penas, a começar pela perda de Jesus em Jerusalém, aos
doze anos; e, depois, a morte do pai José, a partida de Jesus de Nazaré,
afastando-se de Maria, para cumprir uma missão árdua e difícil, até aos dias terríveis
da paixão, que fizeram de Nossa Senhora a mãe de todas as dores.
Muitas
famílias se reconhecerão nesta imagem e se sentirão reconfortadas pelo exemplo
da Sagrada Família nas muitas dores da existência quotidiana, com as doenças,
as dificuldades económicas e as necessidades laborais que obrigam a viver longe
de casa, até à morte das próprias pessoas queridas.
Há
certas dificuldades, porém, pelas quais Jesus, Maria e José não passaram, como
as que se devem aos defeitos, leves ou graves, dos membros de uma família.
Invejas, ciúmes, pequenas e, por vezes, não tão pequenas crueldades, maus
humores, nervosismos, incapacidade de entendimento e de aceitação mútuos. São
estas as principais dificuldades que hoje fazem naufragar tantos projetos de
vida comum e que ofuscam a existência de tanta gente. A família de Nazaré está
presente, antes, com o exemplo de uma vida contrária a tudo isso.
Alguma
solução e ajuda poderão, pelo contrário, ser-nos dadas por todas aquelas
páginas da Escritura que mostram os sofrimentos de famílias em dificuldades,
ensinando-nos também as formas de superá-las. Pensemos na história de Abraão,
de Jacob ou de David, famílias de modo algum exemplares, que, no entanto, são
visitadas pela graça do Senhor. Se cada família soubesse reconhecer a graça
formidável do sacramento do Matrimónio, nela presente, também encontraria a
força para superar desentendimentos e divisões e para curar diariamente as
feridas a que a vida quotidiana não nos poupa.
Hoje,
portanto, não nos é apresentado apenas um exemplo luminoso de vida familiar,
mas muitos exemplos de famílias difíceis nas quais, porém, a graça de Deus
atuou. É sobretudo essa graça que deve dar força às famílias em crise para
superar os momentos difíceis e vencer a tentação de ceder ao naufrágio,
infligindo assim muitos males à sociedade.
Peçamos
a Jesus, Maria e José que velem pelas nossas famílias e lhes deem esperança nas
dificuldades crescentes que hoje têm de enfrentar.
Card. Carlo Maria
Martini
In Tomados de assombro, ed. Paulinas
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