O hoje insubstituível da Família


Iniciamos este ano uma experiência pastoral que gostaria que trouxesse muitos frutos para a nossa Arquidiocese. No domingo mais próximo do dia 15 de Maio, Dia Mundial da Família, celebraremos uma homenagem e gratidão aos casais que durante o ano celebram 25 anos, 50 ou mais de vida matrimonial. Com eles louvaremos o Senhor pela fidelidade ao sim dado e pediremos bênçãos para que a aliança matrimonial continue revestida de pleno significado e fidelidade mútua.

O Evangelho de hoje pode ajudar-nos a refletir, fazendo uma transposição e interpretação para a vida matrimonial. Guardar a Palavra (de Deus no Evangelho e o do vosso “sim” no dia da celebração matrimonial) é condição indispensável para que entre vós Deus esteja presente e que Ele estabeleça a sua morada na vossa casa.

Deus vale por Ele mas a Sua presença é certeza de força e coragem para as dificuldades e fonte de alegria para quem caminha na fidelidade.

Por outro lado, o Evangelho recorda que a paz (a felicidade) dada por Cristo não é a paz do mundo. É totalmente diferente. Quando ouvimos tantos outros profetas da felicidade, optar por Cristo, no meio de muitas dificuldades, significa que a vida terá força. O casamento católico nem sempre é compreendido. Há quem o abandone, há quem o interprete pessoalmente atenuando as suas exigências. Mas, também é bom recordar, há muitos casais que testemunham verdadeira felicidade entre eles e com os seus filhos e netos. Hoje, entre outras coisas, corremos a grande tentação de olhar para outros modelos mais fáceis e pensar que isso é o normal. Urge pensar e retirar conclusões concretas para a vida. A fidelidade ao sim, colocando os meios necessários para isso, proporciona a verdadeira alegria e felicidade que muitos procuram e não encontram. Vós estais aqui a testemunhar como é verdade.

Esta doutrina vale por ela. Mas a atual situação de crise veio dar-lhe valor. Os Bispos Portugueses publicaram há dias uma Nota Pastoral sobre “A força da família em tempo de crise”. Aí se sublinha, neste tempo de crise económica a família como um bem social, reconhecendo que “tem sido a solidariedade familiar, que se traduz em solidariedade entre gerações, em muitos casos, o primeiro e mais seguro apoio de quem se vê a braços com o desemprego, ou a queda abrupta de rendimentos, com a consequente incapacidade de fazer face a compromissos assumidos que se destinam à satisfação de necessidades familiares essenciais, como o da habitação.”

É por esta razão de fidelidade aos compromissos assumidos a que, na atualidade e infelizmente podemos acrescentar motivações sociais, que os Bispos sublinham “a família como um projeto duradouro, assente num compromisso de doação total e não na volatilidade dos sentimentos.”

Muitos poderão não concordar com a indissolubilidade do casamento e a Igreja não deixará de a defender e propor. Como projeto duradouro não é fácil se não for acompanhada pelo alimento quotidiano do amor e, particularmente, da preparação que um compromisso importantíssimo exige.

Mesmo assim, e voltando a recordar quanto os Bispos referem “a sublimidade da doutrina não pode significar insensibilidade ou indiferença perante o sofrimento de quem experimentou um fracasso matrimonial, independente de qualquer juízo de culpa, que até pode existir. A Igreja acolhe e acompanha com solicitude estas pessoas.”

A gratidão e homenagem a quem tem sido fiel ao amor com o reconhecimento da vontade da Igreja em querer acompanhar quem rompeu com os laços matrimoniais, conduzem-nos a uma consideração importante: a necessidade de recuperar permanentemente a “pedra preciosíssima como uma pedra de jaspe cristalino” (Apocalipse, 2º leitura) que se vai descobrir numa procura incessante e a concretizar todos os dias. A plenitude do amor nunca se atinge. A dimensão dos seus horizontes está para além da morte. Importa, por isso, diariamente procurá-lo em comum através do diálogo e da oração.

Na primeira leitura, víamos que na Igreja primitiva tinha surgido um problema que poderia conduzir à rutura entre cristãos oriundos do judaísmo e do mundo pagão. Paulo e Barnabé provocam o diálogo, na frontalidade de se abrir às razões dos outros, de modo que, colocando o amor no meio como objetivo final, chegaram a uma verdadeira experiência. “O Espírito Santo e nós” é que tinha delineado o trajeto a seguir. É este encontro no nós e a abertura às exigências duma vida cristã que o Espírito Santo esclarece, ilumina e aponta o caminho a seguir. Quantos de vós já não tivestes esta experiência de em comum chegar a conclusões que nunca tinham sido pensadas antes por cada um. Isto exige um saber perder sem deixar de dizer tudo na verdade e caridade. A luz acontecerá. Fugir a esta responsabilidade de encontrar-se para redescobrir a pérola preciosa é o trabalho que importa realizar.

Neste ano da Fé acreditamos no Amor de Deus e procuramos levar o nosso amor a essa fonte. Antes de vos encontrardes, Ele descobriu-vos e preparou a aventura que tendes experimentado. Crescei por isso, e dai o vosso contributo para que outros cresçam no amor a Deus. O resto acontecerá. Não sem trabalho e dedicação. Mas como alegria sempre renovada.

Gostaria de vos expressar, em meu nome e da Igreja de Braga, os sinceros votos de parabéns pelos 25, 50 ou mais anos de vida em comum. Asseguro-vos que irei rezar para que as vossas vidas sejam “para bem” um do outro, “para bem” dos vossos filhos e netos, “para bem” da Igreja e da sociedade. Aceitai um abraço de muita ternura e gratidão e que Deus continue a abençoar-vos com as suas bênçãos.

Antes de terminar, quero deixar uma referência simbólica. No final da Eucaristia colocaremos em local adequado uma Relíquia do Beato João Paulo II que esteve no Sameiro no dia 15 de Maio de 1982, onde falou para todas as famílias de Portugal no âmbito da sua Visita Pastoral dando o Título à homilia: “A Família comunidade insubstituível”. Por coincidência a ONU veio a declarar o dia 15 de Maio como Dia Internacional da Família, em 1994, 12 anos depois.

Como invocação deixo as suas últimas palavras da homilia efetuada no Sameiro e a Oração com a qual concluiu a mesma homilia:

“Irmãos e Irmãs: É grande o sacramento do Matrimónio, que deu origem às vossas famílias e continuam a vivificá-las! É grande a missão das vossas famílias: o futuro do homem sobre a terra está ligado à família; o Plano Divino da Salvação e a história da Salvação passam através da Família humana!



Virgem Imaculada, Nossa Senhora do Sameiro,

Mãe do «Menino» posto como «Sinal de Contradição»:

junto do vosso Filho, Jesus Cristo,

cujas palavras conserváveis e meditáveis no Vosso coração

dai a todas as famílias de Portugal a graça

de saberem ouvir e guardar fielmente a Palavra de Deus!

Mãe do Verbo divino, na Sagrada Família de Nazaré,

obtende para estas famílias a harmonia, o amor e a graça!

Que nelas nunca seja contradição «o Sinal»,

nunca seja contradito o amor de Deus misericordioso,

manifestado em Jesus Cristo! Amen.




D. Jorge Ortiga, A.P.

Homilia na celebração arquidiocesana de Braga da Família

Sé Catedral de Braga, 12 de Maio de 2013.

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