Homilia de D. Jorge Ortiga na Eucaristia do Encerramento do Dia Arquidiocesano da Família
Caros sacerdotes e religiosas
Estimadas famílias
Irmãos e irmãs na fé em Cristo Jesus
Ao celebrarmos o Dia Arquidiocesano da Família,
gostaria de começar esta reflexão com um exercício de memória. Por isso,
lanço-vos a pergunta: “Onde estavas tu no dia 15 de Maio de 1982?”.
Para te ajudar, permite-me que recorde estas palavras:
“Dai a todas as famílias de Portugal a graça de saberem ouvir e guardar
fielmente a Palavra de Deus!”, proclamava o saudoso Papa João Paulo II perante
meio milhão de pessoas, que o aclamavam no Monte do Sameiro, em Braga.
Curioso ou não, passados 30 anos a Arquidiocese de
Braga neste ano pastoral faz o mesmo pedido a todas as famílias: alimentar-se
da Palavra de Deus!
1. A narrativa evangélica de hoje transporta-nos para
o momento da Ascensão de Jesus ao Céu, após a sua Ressurreição. Muitas vezes, pensamos
que a Ascensão significa a saída, o abandono ou a ausência de Jesus neste
mundo. Porém, o Papa Bento XVI instrui-nos dizendo: “a ascensão não é a
partida para uma zona distante do universo ou para um planeta longínquo, mas a
proximidade permanente.”1
Ou seja, Jesus já não Se encontra agora num lugar
concreto do mundo, mas em toda a parte, podendo assim ser evocado, amado e
vivenciado por todos os homens. Trata-se, por isso, de uma presença divina e
não meramente espacial.
Aliás, o evangelista Marcos enumera alguns sinais
deste novo modo de presença: a expulsão dos demónios, a impassibilidade ao
veneno, a cura de doentes e a dicção de novas línguas. Também a família deve
ser lugar dessa presença, concretizando aquelas palavras: “onde dois ou três
estiverem reunidos em meu nome, eu estou no meio deles!”
2. Na verdade, a linguagem dos cristãos resume-se a
uma palavra: amor. Foi esse o mandato de Jesus antes de subir para o Pai: “ide
por todo o mundo e anunciai o amor a toda a criatura!”
Uma consequência do anúncio deste amor é a família
humana. Sem amor não há família, mas um aglomerado de pessoas a viver num mesmo
espaço comum. E sem família, a sociedade perde as suas células, acabando por se
auto-destruir. Mas há deveres e direitos próprios da família que merecem ser
respeitados, tendo em conta a própria sobrevivência da sociedade.
Um desses direitos foi reivindicado pelo
Secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) na mensagem para o Dia
Internacional da Família, apelando a um maior equilíbrio entre o tempo
laboral e o tempo familiar, algo que o Cardeal Monteiro de Castro já
alertara e que foi mal interpretado na comunicação social.
A família precisa de um “tempo legal” para si, como fruto
de uma legislação que contempla esse direito e como coragem dos
membros que reconhecem a importância de um tempo próprio em conjunto.
Além disso, enumero ainda um outro pormenor
relacionado que assombra as nossas famílias: o desemprego, como negação
do direito ao trabalho. O número não pára de aumentar, os bancos atenuam os
juros do crédito, as contas ficam por pagar, o frigorífico começa a ficar vazio
e o ambiente relacional crispa-se… pois como diz o provérbio: “casa sem pão,
todos ralham e ninguém tem razão!”
Perante este realismo, Paulo na segunda leitura
recorda-nos que fomos “chamados à esperança”! Ora, é esta esperança que
somos convidados a anunciar: uma esperança que se traduz em solidariedade! As
famílias necessitam de se conhecer e ajudar. A proximidade dos lares pode
tornar-se numa proximidade das alegrias e esperanças que narram o quotidiano.
3. Por último quero referir um dever urgente que as
famílias nunca poderão esquecer. No documento Familiaris Consortio, o
Papa João Paulo II incumbiu a família cristã de uma exigente tarefa, quando
refere:
«Onde uma legislação anti-religiosa pretende impedir
até a educação na fé, onde uma incredulidade difundida ou um secularismo
invasor tornam praticamente impossível um verdadeiro crescimento religioso,
aquela que poderia ser chamada "Igreja doméstica" fica como único
ambiente, no qual crianças e jovens podem receber uma autêntica catequese»2.
Partindo deste legado, ouso afirmar que a
nova-evangelização, tão desejada pelo Papa Bento XVI3, passa precisamente também pela evangelização da
família. Sois simultaneamente evangelizados e evangelizadores! Sois um
cativeiro de vocações! Sois um areópago que dispõe de vantagens únicas e
propícias para a evangelização!
O fator de proximidade, de diálogo mútuo e de educação
integral, exigem uma maior atenção ao anúncio da fé, por outras palavras: a
fazer da Ascensão de Jesus uma presença real na vida dos membros que
constituem a vossa família! Não deixeis de ser anunciadores dum Cristo amigo,
fiel e presente! Fazei-o com coragem neste mundo de tantas mensagens! Se
celebrarmos, hoje, o Dia das Comunicações Sociais, procurai educar os vossos
filhos para um uso reto desses meios: eles não podem ser um meio de perdição,
mas de formação!
4. Para terminar, a Beata Madre Teresa de Calcutá
dizia: “a tuberculose e o cancro não são as piores doenças. Creio que a pior
doença é não ser amado.”
Daí que ao encerrar mais um Dia Arquidiocesano da
Família, não vos apresente soluções, mas apenas vos ofereça de novo aquelas
palavras que presidiram ao vosso encontro: Comunhão, Alegria e Palavra.
Se não queremos sentir a pior das doenças,
alimentemo-nos da Palavra de Deus, “que é um amparo precioso”! Dela surgirá a
comunhão familiar! E desta, a alegria de uma família que, no meio das tristezas
e alegrias, sente a força redentora do Senhor Jesus, que subiu aos céus para
estar mais perto de nós!
Por fim, agradeço a todas as Equipas Arciprestais da
Pastoral Familiar e peço-vos que concretizemos quanto o Beato João Paulo II
desejava: “Depois da minha morte, gostava de ser recordado como o Papa da
Família e da Vida!”
Em pleno mês de Maio, o mês de Maria, consagremo-nos
àquela que é “a rosa mais bela que desabrochou no jardim da criação!” E tal
como aconteceu há 30 anos no Monte do Sameiro, é este o pedido que faço ao
Senhor: “Dai a todas as famílias de Portugal a graça de saberem ouvir e guardar
fielmente a Palavra de Deus!”
+ Jorge Ortiga, A. P.
Caxinas,
20 de Maio de 2012
1 Joseph
Ratzinger, Jesus de Nazaré. Da entrada em Jerusalém até à Ressurreição,
229
2 João Paulo II, Familiaris
Consortio, 52
3 Bento XVI, Porta
Fidei, 5
Comentários
Enviar um comentário