No capítulo 18 do Evangelho
segundo Mateus, lemos diversos ensinamentos de Jesus sobre a vida da sua
comunidade, a comunidade cristã.
O evangelista os recolhe e os reúne
aqui para dar aos cristãos orientações em uma hora já marcada pela
fadiga da vida eclesial entre irmãos e irmãs em conflito, por
rivalidades e patologias de relações entre autoridades e crentes. A
mensagem central dessa página indica a misericórdia como decisiva,
absolutamente necessária nas relações entre irmãos e irmãs.
Os poucos versículos proclamados neste
domingo querem indicar a necessidade da reconciliação tanto na vida quotidiana, quanto na oração dirigida ao Senhor vivo. Eis, então, a
primeira palavra de Jesus: “Se o teu irmão pecar (contra ti), vai
corrigi-lo, mas em particular, à sós contigo! Se ele te ouvir, tu
ganhaste o teu irmão”.
Na verdade, essa sentença de Jesus é
atestada nos manuscritos em duas formas: a curta, que fala de um irmão
que peca (isto é, que comete um pecado contra as exigências cristãs), e a
longa, que especifica “contra ti”, levantando a hipótese de uma ofensa
pessoal. No primeiro caso, a diretriz seria eclesial e, portanto, se
trataria de um comportamento específico a ser vivido como Igreja; no
segundo caso, Jesus se referiria à reconciliação fraterna em caso de
dissídio ou ofensa. A tradução italiana oficial [e também a brasileira]
opta por esta segunda leitura, mas tanto uma versão quanto a outra são
acentuações diferentes de uma única verdade, porque o pecado entrevisto,
mesmo assim, é um pecado grave que impede a comunhão fraterna.
Jesus pede a correção e a reconciliação
entre aqueles que estão em conflito, entre o ofendido e o ofensor, mas
também as pede em nível comunitário, quando um membro da comunidade,
mediante o seu pecado, contamina todo o corpo, torna-se sujeito de
escândalo, de obstáculo para a vida cristã, que é e deve ser sempre
comunhão entre diversidades reconciliadas e, portanto, sinfónicas.
A comunhão exige um compromisso sério,
até mesmo um esforço, e é uma questão de ser responsável e guardião
também do outro. É preciso prestar atenção para não ler nessas palavras
de Jesus um procedimento jurídico cristão, a ser observado como uma lei!
Certamente, Jesus se inspira naquilo que se lê no Levítico: “Não guarde
no teu coração ódio contra o seu irmão. Repreenda abertamente o seu
próximo, e assim você não carregará o pecado dele” (Lv 19, 17; cf.
também Eclo 19, 13-17).
Mas ele não dá uma nova lei capaz de
resolver os conflitos e de eliminar os pecados, mas pede que, no meio
das tensões, dos conflitos, das controvérsias e das ofensas que
inevitavelmente ocorrem em toda comunidade, permaneça o desejo de
comunhão, a vontade de edificação comum, a responsabilidade inteligente
de cada um para com todos. Quando ocorre o pecado grave e manifesto na
comunidade cristã é preciso agir com criatividade, sabedoria, paciência
e, acima de tudo, misericórdia.
Então, o que o cristão maduro deve
fazer? Admoestar o pecador, certamente, mas com muita caridade.
Admoeste-o no momento oportuno, admoeste-o com humildade e clareza,
admoeste-o cobrindo a sua vergonha, não a revelando aos outros,
portanto, sozinho. Quem faz a correção deve ter o coração de Jesus que
perdoa, não despreza e não se alimenta de preconceitos. Deve fazê-lo com
o espírito do bom pastor, que, na parábola contada imediatamente antes
por Jesus, vai buscar a ovelha que se perdeu (cf. Mt 18, 12-14). Deve
fazê-lo não porque a lei foi quebrada, mas porque aquele que pecou fez
mal a si mesmo, escolheu o caminho da morte e não o da vida.
Em todo o caso, quem corrige não pode
pensar que deve erradicar o joio e salvar o trigo bom (Mt 13, 24-30)!
Portanto, todo o possível deve ser tentado para que aquele que se perdeu
reencontre o caminho da vida e que aquele que ofendeu o irmão
reencontre o caminho da reconciliação.
Jesus pede simplesmente isso, mas
constatamos como é difícil, nas comunidades cristãs, esse simples passo
rumo à comunhão. Parece que a arte de admoestar e corrigir o outro, arte
certamente delicada e difícil, não é possível e, em vez disso, dá lugar
à indiferença por parte daqueles que estão preocupados demais consigo
mesmos e com a própria salvação para pensar nos outros.
Mas, no Evangelho, testemunha-se também a
possibilidade de que a correção fraterna tenha um resultado negativo: o
irmão que pecou pode não querer ser corrigido, muito menos mudar de
atitude, convertendo-se do caminho tomado em contradição com o
Evangelho. O que fazer nesse caso?
Aceitando sem rancor a rejeição oposta
pelo irmão, será preciso buscar um caminho ulterior em relação ao
percorrido, talvez recorrendo à ajuda de outros irmãos e irmãs da
comunidade: “Se ele não te ouvir, toma contigo mais uma ou duas pessoas,
para que ‘toda a questão seja decidida sob a palavra de duas ou três
testemunhas’” (Dt 19, 15).
Também nessa opção, não se deve ler um
procedimento jurídico rígido por parte de Jesus! Em vez disso, é preciso
captar o espírito de tais injunções, que querem salvar o irmão ou a
irmã, não tornar a comunidade pura, percorrendo caminhos de exclusão.
Pedir a ajuda de outros irmãos significa buscar o terceiro que ajude na
reconciliação quando não há possibilidade de acordo no face a face,
significa buscar a palavra de autoridade de outros, que ajude a
discernir melhor qual é o caminho da conversão.
Depois, se esse caminho também for
insuficiente, então – diz Jesus – pode-se pedir à assembleia, à Igreja
(ekklesía) que intervenha para que o conflito seja resolvido e o apelo à
conversão seja expressado com a máxima autoridade. Mas mesmo essa
última tentativa pode não ter sucesso, e então?
Não se esqueça de que a assembleia não é
um tribunal de última instância, mas uma oportunidade para ouvir a voz
dos irmãos e das irmãs no corpo de Cristo, a Igreja: “Se nem mesmo à
comunidade, à Igreja ele ouvir, seja tratado como se fosse um pagão ou
um pecador público (ho ethnikòs kaì ho telónes)”.
Essa atitude, assumida por quem foi
ofendido ou viu o pecado, corrigiu e não foi ouvido, não é a excomunhão,
palavra usada com acepções ou interpretações fantasiosas. Não! Jesus
diz que, se forem esgotadas todas as tentativas de correção fraterna e
de reconciliação, então é preciso se distanciar para conservar a paz e
não irritar o irmão, é preciso considerá-lo como se fosse pertencente
aos gentios (um pagão) ou como um publicano. Ou seja, alguém a quem
Jesus amava e estava disponível para se encontrar (cf. Mt 9, 11; 11,
19), um doente que precisa ser curado, um pecador que precisa de perdão.
Neste ponto, o cristão assume sobre si
duas responsabilidades, a de perdoar o pecado ou de não lhe perdoar:
“Tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que
desligardes na terra será desligado no céu”.
O poder de ligar e de desligar,
conferido por Jesus a Pedro (cf. Mt 16, 19) também é dado a cada
cristão, para que exerça o ministério da reconciliação, sempre e com
autoridade. Esse poder é dado aos discípulos como o próprio Jesus o
teve, “não para julgar, mas para salvar o mundo” (cf. Jo 3, 17).
Na sua Regra, São Bento legisla sobre
essas patologias vividas às vezes pela comunidade e sabe que, esgotada
toda possibilidade de correção de um irmão que continua habitando no
pecado grave, só resta rezar, devolvendo o outro à misericórdia do
Senhor e ao poder da graça, o amor que nunca deve ser merecido (cf. RBen
23-28). A excomunhão monástica prevista por Bento para o irmão pecador
que não se arrepende também é apenas remédio: exclusão da mesa e da
oração comum, mas nunca exclusão total do irmão.
O “resgate” de um irmão, de uma irmã é
obra delicada, cansativa, que requer paciência e deve ser inspirada
apenas pela misericórdia. Porque todos somos fracos, todos caímos e
precisamos ser ajudados e perdoados: na comunidade cristã, não há puros
que ajudam os impuros ou sãos que cuidam dos doentes! Mais cedo ou mais
tarde, conhecemos o pecado e precisamos de uma ajuda inteligente e
verdadeiramente misericordiosa, a ajuda que viria de Deus. De fato, é
preciso se salvar juntos, como Bento escreve ainda na Regra: “Cristo nos
conduza todos juntos à vida eterna (nos pariter ad vitam aeternam
perducat)” (RBen 72, 12). Ninguém se salva sozinho: que salvação seria
essa que diz respeito apenas a mim mesmo, sem os outros? Que reino de
Deus seria aquele em que se entra sozinho, enquanto os outros ficam de
fora? Que solidão, que tristeza...
Precisamente por isso, Jesus pede aos
seus discípulos que, quando rezem, estejam em comunhão. Não basta rezar
uns ao lado dos outros, justapostos, não basta rezar com as mesmas
fórmulas ou fazer os mesmos gestos. Para que a oração seja autêntica e a
liturgia, agradável a Deus, é preciso sobretudo concordar (verbo
sýn-phonéo) na caridade, ser comunhão. Então, a oração é ouvida, porque,
onde há sinfonia dos corações, lá está o Espírito Santo, o dom dos
dons, sempre concedido a quem o invoca (cf. Lc 11, 13). E bastam poucos,
dois ou três que rezam na fé de Cristo Senhor, para que o próprio
Cristo esteja presente.
Diziam os rabinos: “Quando dois ou três
estão juntos, e entre eles ressoam as palavras da Torá, então a
Shekinah, a Presença de Deus, está no meio deles” (Pirqé Abot 3, 3).
Analogamente, Jesus diz que, quando mesmo apenas dois ou três irmãos ou
irmãs se reúnem no seu Nome, na caridade recíproca, então ele está
presente. Sim, Jesus está presente lá onde se vive o amor, a caridade
entre os irmãos, entre as irmãs.
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