Verbalizar o amor? Sempre!

A cena é habitual nos percursos escola-casa e casa-escola: a minha filha e eu vamos sentadas lado a lado e depois de alguns segundos em silêncio ela pega-me na mão e dá-lhe um beijinho, sem que eu faça ou diga alguma coisa. E depois acrescenta: “gosto de ti”. É uma ternura que me derrete o coração e de quem assiste.

Desta vez estava sentada à nossa frente uma senhora de cerca de 70 anos, que levou a mão ao peito. “A minha filha nunca, nem em adulta, me disse que gostava de mim…”, disse enternecida e algo triste.
Fiquei a pensar no assunto. Será esta geração, a minha, mais expansiva no que toca aos sentimentos? Falaremos mais de amor?
A conclusão a que cheguei é que depende muito das famílias, é certo, mas acredito que sim. Não é preciso recuar muito para perceber que não era habitual esta troca afectiva de palavras em público, havia muito o “não dito”, para o bom e para o mau.
Eu próprio não cresci a dizer aos meus avós que gostava deles, por exemplo. E isso não significava que não gostasse, simplesmente não era suposto dizer-se, falar-se desse sentimento… Ainda há um ano sussurrei ao ouvido do meu avô paterno o quanto gostava dele. Foi a primeira vez e infelizmente não consigo ter a certeza se ele me conseguiu ouvir. Disse-o, eventualmente, tarde demais.
Mas também cresci a acreditar que o amor é muito mais que uma palavra, que é nos gestos e atitudes que ele vive e permanece. Quantas vezes vi um “amo-te” na boca de alguém que o dizia sem o sentir? Nunca o quis para mim e para mim é sagrado: se o sinto, digo-o, mas essa aprendizagem veio com o nascimento da minha filha.
Foi ela que me ensinou a viver o amor desta forma de gritar aos quatro ventos como somos sortudos. E ensino-lhe, através do exemplo, a dizer que gosta de mim dizendo-lhe que gosto dela. Vai sempre dormir depois de ouvir que a amo. Nunca a faço dizer, nunca lhe digo que diga a alguém só para deixar essa pessoa feliz. Ela já percebeu que há um momento para o dizer e pessoas a quem o dirigir. Portanto, se somos bafejados com essa sorte, aproveitemos. Se não somos, nada de ficar tristes, todos amamos as pessoas de formas diferentes e expressamos os nossos sentimentos de formas diferentes.
Deixei de esperar pela altura certa para dizer aos que me são importantes, que o são. Acho que a bolha de amor que se cria ao saber que somos gostados ajuda à nossa auto-estima, por exemplo. Ajuda um dia cinzento a receber alguns raios de sol. Ensina que devemos priorizar o positivo em vez do negativo.
Os dias nem sempre são fáceis, mas se alguém, onde quer que esteja, nos fizer chegar a mensagem de que somos importantes para eles, então há coisas que valem a pena. Mesmo num dia mau.
Por isso, sempre que a minha filha me disse “gosto de ti”, eu responderei de volta “eu é que gosto de ti” e estaremos nesta espiral do eu gosto mais até que nos cansemos e haja beijos nas bochechas e um abraço a selar o acordo: gostamos ambas, como haveríamos de não gostar?
Porque o amor é mesmo o melhor do mundo (então na boca dos nossos filhos, torna-se o paraíso…).
Amem muito. E não deixem para amanhã se o puderem dizer hoje.

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